As tendências para a formação médica e o mercado de trabalho em saúde no Brasil estiveram em pauta no terceiro encontro da reunião técnica “Acesso e qualidade a cuidados e serviços de saúde: desafios para a gestão dos Recursos Humanos em Saúde”, promovida dia 22 de outubro pela Unidade Técnica de Capacidades Humanas para a Saúda da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), em coordenação com a Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Brasília. Para a coordenadora da Unidade Técnica de Capacidades Humanas para a Saúde da Opas, Mónica Padilla, a agenda cumpriu o objetivo de promover um olhar abrangente e multidisciplinar sobre a formação de médicos e profissionais de saúde no Brasil e apontar pautas para a pesquisa e para o campo das políticas públicas. “Agora, precisamos identificar ações de médio e longo prazo que podem ser impulsionadas pelo Ministério da Saúde, bem como ampliar o diálogo com o Ministério da Educação, para juntos avaliarmos com responsabilidade as escolas de formação em saúde, auxiliando-as a preparar os profissionais que o Sistema Único de Saúde (SUS) precisa”, afirmou.
O pesquisador ressaltou que o planejamento de longo prazo é imprescindível para que essa nova força de trabalho seja formada e orientada a partir das necessidades de saúde da população e da realidade do SUS. “É um esforço político, de pesquisa e que exige uma multiplicidade de métodos e olhares. A OPAS e a Rede Observatório de Recursos Humanos em Saúde do Brasil (ObservaRH) têm desempenhado um papel estratégico em promover o diálogo entre pesquisadores e instituições, de forma a juntar as peças desse imenso quebra-cabeças”, reconheceu.
Scheffer também defendeu a criação de um sistema de monitoramento e avaliação sobre recursos humanos para a saúde como ação prioritária para apoiar políticas do setor. “É preciso reunir, sistematizar, processar e interpretar informações sobre a educação médica, considerando a oferta de vagas para graduação e especialização; o perfil dos estudantes e futuros profissionais; a situação do mercado de ensino; a avaliação da formação; o mercado de trabalho e a prática profissional; a remuneração e a atratividade da profissão; as áreas de atuação e as especialidades; as práticas pública e privada; a interação com outras profissões de saúde e com o próprio sistema de saúde; dentre outros aspectos”, afirmou.
Diante da tendência à privatização da educação médica no Brasil – 70% das novas vagas de medicina são privadas – Scheffer indicou a necessidade de um novo modelo de avaliação da formação médica. “Precisamos conhecer a qualidade do ensino dessas das novas escolas, saber como elas estão incorporando as Diretrizes Curriculares Nacionais. Esse grande debate nacional é inevitável, sobretudo no contexto de ampliação das escolas médicas privadas”, argumentou. Além das vagas de graduação em Medicina, Scheffer analisou o perfil da residência médica no país. “A oferta de vagas para esta modalidade cresceu bastante desde a implantação do Programa Mais Médicos, mas ainda pode ser incrementada. Em 2018, há 40.479 médicos residentes no Brasil, vinculados a 6.574 programas, de 799 instituições. No entanto, a distribuição das vagas ainda obedece ao padrão de concentração no Sudeste”, resumiu.
O pesquisador também apontou a ociosidade de vagas. Em 2017, quase 40% das vagas de residência médica ofertadas em todo o país não foram ocupadas. E o índice de desocupação foi superior a 40% em 11 estados brasileiros: Maranhão, Ceará, Amapá, Alagoas, Sergipe, Tocantins, Rio Grande do Norte, Piauí, Bahia, Amazonas e Mato Grosso do Sul. A mesma dinâmica de concentração e desocupação de vagas foi verificada na escolha das especialidades dos futuros médicos brasileiros. Enquanto cinco campos concentram quase 50% dos especialistas – Clínica Médica, Pediatria, Cirurgia Geral, Ginecologia e Obstetrícia e Anestesiologia – mais de 60% das vagas para residência em Medicina Preventiva Social não foram preenchidas. “Estamos formando 34 mil novos médicos por ano. Precisamos compreender como eles serão incorporados pelo sistema de saúde e pelo mercado de trabalho, de forma a atender as necessidades de saúde da população. O país está diante de uma excelente oportunidade, se tivermos a ousadia de não repetir o padrão de concentração de recursos e especialidades”, concluiu Scheffer.
Rachelle destacou que muitos profissionais de saúde não são apresentados ao SUS durante a graduação e têm o primeiro contato com o sistema público de saúde quando se formam e chegam ao mercado de trabalho. “Muitos dos problemas que enfrentamos hoje em relação ao acesso e à resolutividade do SUS podem estar relacionados a essa lacuna entre o universo das formações em saúde e a realidade dos serviços públicos. Se o projeto pedagógico das graduações em saúde incluísse, obrigatoriamente, práticas de formação em serviço, no SUS, certamente esses profissionais chegariam mais bem preparados ao sistema de saúde”, ponderou.
Esse encontro fez parte do ciclo de três rodadas de apresentações e debates, organizados pela Unidade Técnica de Capacidade Humanas para a Saúde da OPAS, que priorizou temas subsidiados em torno de evidências científicas, marcos regulatórios e experiências locais sobre as dimensões da educação e do trabalho nas profissões da saúde.
– Saiba mais sobre outros dois encontros, realizados nos dias 10 e 11 de outubro, que abordaram a ampliação do escopo de práticas na APS e a regulação das profissões de saúde e as transformações na educação médica após a implementação do Programa Mais Médicos.
Apresentações
-O Modelo de regulação de profissões de saúde do Brasil: Características e Desafios
Mario Scheffer – DMP-FMUSP
-Graduação, Resistência Médica e Mercado de Ensino após a Lei Mais Médicos
Fotos
ENTREVISTAS







