União do Oeste é um pequeno município do oeste do estado de Santa Catarina, com uma população de aproximadamente 3 mil habitantes. Sendo assim possui somente uma Unidade Básica de Saúde, com uma equipe de estratégia da saúde da família. Tendo sua economia voltada para as atividades agrícolas, desenvolvidas por pequenos produtores rurais, seu principal aspecto econômico é a agropecuária, com a criação de suíno, gado, leiteiro e de corte, cultivo de milho, soja, feijão, fumo. Já a população da zona urbana constitui-se de assalariados que trabalham nas pequenas indústrias, funcionários públicos, diaristas e comerciantes de pequeno porte.
A partir do momento em que o NASF passou a realizar reuniões semanais efetivas, sendo que estas aconteceram pelo interesse destes profissionais em auxiliar a equipe e trabalhar junto com as demandas emergentes durantes os atendimentos, para além do curativo e para além das “quatro paredes”. Deste modo iniciamos a conversa com a atenção básica para se pensar em possibilidades e estratégias para ampliar as ações de políticas de saúde para adolescente e jovem. Desse modo, a equipe de profissionais de saúde procedeu uma avaliação de dados existentes na própria UBS. A partir dessa análise, e considerando a realidade cotidiana do município, foi constatado grande número de gravidez na adolescência, o que fomentou um diálogo com os profissionais das escolas municipal e estadual.
Concretizado o diálogo e as parcerias com as escolas, foi desenvolvido o projeto Adolescer Consciente, cujo principal objetivo é promover saúde e prevenir agravos para que a transição e a vivência da fase da adolescência possam se dar de forma saudável e consciente.
Para desenvolver a metodologia de trabalho, consideramos que a população nessa faixa etária procura a sua própria identidade e questiona as regras e limites impostos. Assim, surgiu a ideia de desafiarmos esses adolescentes. A cada atividade de orientação trabalhada, lançava-se um desafio aos adolescentes. Até hoje, participaram do projeto aproximadamente 300 adolescentes.
Na primeira edição do projeto Adolescer, que ocorreu no ano de 2016, realizamos o trabalho nas escolas, sendo que na Escola Municipal, com a turma do 5º ano, foram realizadas ações orientadas pela Caderneta de Saúde do Adolescente. Na Escola Estadual, foi disponibilizada, na primeira semana de aula, uma caixa “tira dúvidas”, na qual os adolescentes participantes do projeto (8º, 9º ano e ensino médio) puderam depositar suas dúvidas de forma anônima. Essas dúvidas foram o ponto de partida para o trabalho realizado posteriormente.
Adolescência e sexualidade
A primeira atividade foi desenvolvida utilizando recursos audiovisuais com orientações e espaço para esclarecimento de dúvidas. A partir disso, foi lançado o desafio do “júri simulado”, em que cada turma recebeu um caso fictício que citava o adolescente envolvido em diversas situações de condutas inadequadas, bem como em ato infracional. Os adolescentes deveriam, enquanto grupo, dialogar e dramatizar o caso, elencando pontos negativos, positivos e possíveis encaminhamentos. O prazo para a apresentação foi de 30 dias.
Os adolescentes dramatizaram a partir dos casos fictícios, encenando alguns personagens, dentre eles, pais dos adolescentes, adolescentes, advogado de defesa, promotor e juiz. Nessa atividade, durante a dramatização, conseguiram dar encaminhamentos pertinentes às situações trabalhadas.
Métodos Contraceptivos e gravidez na adolescência.
Na segunda etapa do projeto, foi abordado o tema gravidez na adolescência e métodos contraceptivos. O recurso utilizado foi audiovisual, bem como a exposição de alguns métodos de contracepção. Na oportunidade, os adolescentes sanaram suas dúvidas, porém observou-se que muitos ainda não se sentiam à vontade para falar sobre o assunto. Nessa etapa da atividade, trabalhamos com foco nos aspectos negativos de uma gravidez na adolescência, orientando os adolescentes a prevenirem-se de uma gravidez não intencional, elucidando os aspectos negativos dessa questão. Porém, mesmo com esse entendimento, orientamos para que se caso a gravidez viesse a ocorrer, alternativas positivas pudessem ser encontradas para avodart-dutasteride essa situação.
Nesta etapa, o desafio lançado foi de que as adolescentes deveriam escolher entre duas opções. Levar um “bebê” (boneca) para casa e cuidar dele em tempo integral, por 24 horas, como se fosse um bebe real. Junto com a boneca, levavam uma bolsa com os itens básicos para o cuidado de um bebê. As adolescentes também tinham a opção de usar uma barriga de gesso que simulava a gestação, tendo que se dedicar aos cuidados necessários de uma gravidez e vivenciar as dificuldades cotidianas dessa situação. Qualquer que fosse a escolha, as adolescentes deveriam, posteriormente, escrever um relatório contando como tinha sido a experiência. Esse relato estaria atrelado à avaliação da disciplina de biologia.
Por sua vez, os meninos adolescentes, a partir de um texto, deveriam organizar um descrever a pesquisa realizada sobre as despesas gastas com um bebê, desde a gestação até depois do nascimento. Esse desafio também estava atrelado a avaliação da disciplina de biologia.
DST’s
Na terceira etapa, a metodologia usada na escola foi uma atividade coletiva de orientação sobre doenças sexualmente transmissíveis, com orientações acerca de causas, sinais, consequências e tratamento. Além das orientações com auxílio de recursos audivisuais, utilizamos imagens ilustrativas com o propósito de que os adolescentes pudessem visualizar sinais e sintomas das doenças trabalhadas.
O desafio para essa etapa foi a confecção de cartazes informativos, nos quais cada turma produziu um cartaz sobre uma DST. Esses cartazes foram expostos como forma de divulgação e ampliação do projeto na UBS. Para a confecção desses cartazes, os adolescentes utilizaram fizeram uma pesquisa acerca das doenças. Além de todas as orientações sobre as DST’s, os jovens criaram um slogan de prevenção para cada doença que foi trabalhada. Cada grupo, ao seu modo, também expos formas de prevenção por meio de ilustrações.
Palestra
Na quarta e última etapa, convidamos os adolescentes participantes e seus pais para uma palestra intitulada como Gravidez: da sexualidade a nova vida. Também realizamos uma roda de conversa com o médico da UBS, com o intuito de orientar as famílias sobre os cuidados necessários com filhos adolescentes. Na oportunidade, foram tratados aspectos sobre a importância do diálogo entre pais e filhos, sobre a vivência da fase da adolescência e sobre as situações de risco que os adolescentes estão expostos.
Nessa atividade, no entanto, observamos pouco envolvimento dos pais. Como atividade de encerramento, esperávamos uma participação maior, apesar de estarmos conscientes de que, nesta realidade, a participação da família é reduzida. Permaneceu o questionamento de como poderíamos ser mais efetivos na estratégia de engajar as famílias nesse processo, o que nos levou a reorganizar a forma de mobilização das famílias para futuras atividades.
Avaliamos que a forma como foram feitos os convites e a mobilização dos pais não foi a melhor estratégia, uma vez que o convite feito a partir de bilhetes encaminhados pelos adolescentes através da escola. Por outro lado, pudemos pensar na própria falta de interesse dos pais em estar participando, seja na atividade, seja na vida dos filhos adolescentes, o que nos gerou uma “certa indignação”, considerando a riqueza da atividade, envolvimento dos profissionais e a oportunidade em estarem sanando dúvidas e absorvendo importantes orientações para o relacionamento familiar, em especial com os adolescentes.
Nova versão do projeto
Dando seguimento a experiência, realizamos algumas modificações para o melhor andamento do projeto em 2018. Reduzimos as etapas de realização das atividades e a metodologia de trabalho. Construímos atividades mais atrativas ao público adolescente, com encontros mais dinâmicos e interativos. As modificações do projeto na edição 2018 contemplam os seguintes aspectos: as ações foram desenvolvidas em três etapas, tendo como público alvo os adolescentes inseridos no 8º e 9º ano da escola estadual, contemplando em média 100 participantes.
Na primeira etapa, foram abordados os temas adolescência, métodos contraceptivos e DSTs. Na oportunidade, foi oferecida explanações sobre os temas e os adolescentes foram motivados a participar da atividade de maneira dinâmica, com perguntas e respostas. Os adolescentes respondiam de acordo com o seu conhecimento e, a partir disso, recebiam orientação dos profissionais.
Tiveram como desafio um único caso. Deveriam ler, interpretar e dramatizar a situação, apontando os possíveis aspectos positivos e negativos, bem como os encaminhamentos. Posteriormente à dramatização, os profissionais questionaram o grupo sobre alguns aspectos norteadores do tema. Essa atividade despertou a criatividade dos adolescentes e fomentou a busca por orientações dos adolescentes com os profissionais envolvidos na UBS. Essa atividade foi avaliada pela disciplina de artes e recebeu a orientação e apoio da professora.
No desenvolver da atividade, durante a construção e organização pelos alunos para a dramatização do caso, os alunos procuraram orientações e materiais, buscando sanar dúvidas acerca das temáticas, tanto com os profissionais presentes na Unidade de Saúde quanto por contato telefônico. Percebemos envolvimento e comprometimento por parte dos adolescentes.
Já como resultado desse trabalho, durante a apresentação das dramatizações, nos deparamos com um universo criativo e de muito aprendizado. Durante as apresentações, as turmas utilizaram diversos cenários e interpretaram um grande número de profissionais para o atendimento dos casos fictícios.
Na segunda etapa, foram abordadas as temáticas gravidez na adolescência e planejamento familiar. Essa atividade foi realizada por meio de roda de conversa com profissionais, na qual os adolescentes puderam colocar suas questões a respeito dos temas. O desafio considerou as avalições feitas pelos adolescentes da edição 2016. Agora, as adolescentes eram desafiadas a usar uma barriga de gesso que simulava uma gestação durante 24 horas. Os adolescentes, por sua vez, deveriam levar uma boneca para casa e deveriam cuidar dela em tempo integral, por 24 horas, destinando à boneca os cuidados necessários, como se fosse um bebê. Levaram também uma bolsa com os itens básicos para esses cuidados.
Todos os participantes, após o desafio, elaboraram um relatório descrevendo a experiência.
Observamos alguma resistência por parte dos meninos em levar o bebê para o cuidado em casa. Também apareceu nos relatórios que alguns pais não aderiram ao desafio da barriga, mencionando não ser pertinente com a idade. Ainda, alguns adolescentes foram sinceros ao mencionarem que simplesmente levaram o bebê para casa e o deixaram no quarto, ou que levaram a barriga de gesso e não usaram.
Nessa atividade, buscou-se construir, junto com o adolescente, a consciência do livre arbítrio e da responsabilidade, pontuando que as escolhas não planejadas trazem consequências, como o preconceito da sociedade, a não aceitação imediata da família, a dificuldade em conciliar uma gestação e cuidado com o filho para com os estudos e trabalho, etc.
Na última etapa, foi realizada mobilização com os pais por meio de convite impresso, bem como por contato telefônico. A atividade final foi uma palestra intitulada Ações para uma vida Plena. A sensibilização para a participação dos pais na atividade final foi positiva, haja vista a receptividade dos pais a partir do contato feito pelos profissionais. Vale destacar que em comparação à versão anterior do projeto, observamos a participação efetiva dos pais na atividade de encerramento, onde a maioria dos responsáveis esteve acompanhando os seus respectivos filhos.
Nessa atividade final, após a palestra, houve entrega de certificado aos alunos participantes do projeto, e cada um recebeu um kit personalizado do projeto.
Lições aprendidas
Com o projeto Adolescer Consciente não foi possível reduzir de imediato o índice de gravidez na adolescência no município, considerando que esse resultado somente poderá ser constatado a médio e longo prazo. A experiência, no entanto, nos possibilitou perceber que o nosso objetivo inicial de prevenir a gravidez na adolescência teve também ganhos secundários importantes. O vínculo e a aproximação dos adolescentes com os profissionais e com a Unidade Básica de Saúde aumentou muito. Também notamos a aproximação das famílias dos adolescentes com as temáticas trabalhadas, fortalecendo vínculos e redes de apoio.
Além disso, percebemos que trabalhar os temas de saúde sexual e reprodutiva e prevenção da gravidez não intencional com adolescentes implica em abordar os projetos de vida e os sonhos que os adolescentes têm para suas trajetórias.