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Impacto da Enfermeira Obstetra de ligação na assistência ao Diabetes Gestacional em uma rede de atenção a saúde

Tema do relato:
Assistência à Saúde na Linha de Cuidado Materno Infantil

Sua experiência está relacionada a que área:
Atenção em saúde

Instituição onde a experiência se desenvolve/desenvolveu (serviço/instituição)
Hospital municipal Dr. Moysès Deutsch/ AMA/UBS Integrada Vera Cruz

Autor(es) Principal
Regiane Morais de Oliveira
Autor(es)
Lucélia Ferreira Lima Bastos
Letícia Yamawaka de Almeida

Situação atual da experiência
Em estágio inicial de execução

Data de início da experiência
2019-10-07

Contextualização/introdução
A fragilidade na comunicação entre profissionais de diferentes pontos de atenção, sobretudo entre a atenção primária e a secundária, barreira no diálogo de profissionais com usuária, bem como desarticulação da rede de serviços, causada pela ausência da contrarreferência prejudica a continuidade dos cuidados. A ausência da integralidade é uma das críticas ao modelo clínico da saúde, cujo enfoque é biologicista, valoriza o conhecimento das especialidades, fragmentando dessa forma a assistência. A Enfermeira de Ligação é uma estratégia exitosa que vem sendo adotada em diversos países para assegurar a continuidade nos cuidados promovendo assim diminuição dessas fragilidades. Estima-se que a prevalência de Diabetes Mellitus Gestacional (DMG) no Sistema Único de Saúde (SUS) seja de aproximadamente 18% e tendo em vista que o sucesso no desfecho perinatal não está relacionado apenas uma assistência adequada no momento do parto torna-se necessária a adoção de medidas que estabeleçam uma assistência mais integrativa no manejo da doença entre esses níveis de atenção. Propõe-se aqui relatar a experiência de implantação da Enfermeira Obstetra de Ligação atuando na integração entre os níveis de atenção primária/secundária de forma a assegurar desfechos materno fetais favoráveis para a gestante com Diabetes Gestacional.
O Projeto foi desenvolvido em um hospital localizado na zona Sul da cidade de São Paulo/Brasil em decorrência de um evento adverso em gestante com falha no diagnóstico de Diabetes gestacional desde o pré-natal. Quando associados à gestação, tanto o diabetes mellitus prévio (tipo 1 ou 2) como o diabetes mellitus gestacional resultam em comprometimento materno e fetal. Além destas complicações, destaca-se o maior risco de óbito fetal e neonatal nas gestações associadas ao diabetes mal controlado. Vimos frente ao ocorrido a oportunidade melhorar a assistência de gestantes com essa patologia. A Enfermeira especialista em obstetrícia foi escolhida para desempenhar essa função devido a sua ampla autonomia nos processos de trabalho no cenário brasileiro atual em comparação às outras especialidades na Enfermagem. Foi estabelecida uma parceria entre a atenção primária referenciada do hospital (atenção secundária) e assim escolhida uma unidade que seria piloto para testar a ideia de mudança.
•Aumentar a taxa de diagnóstico de Diabetes Mellitus gestacional ou Clínico na gestação em 50% na unidade piloto da microrregião do M boi mirim até dezembro de 2022. •Aumentar a taxa de RN nascidos com peso adequado para a idade gestacional em gestantes com Diabetes Mellitus gestacional ou Clínico na gestação em 20% em na unidade piloto da microrregião do M boi mirim até dezembro de 2022.
A implantação do projeto foi norteada pela ciência da melhoria. Assim, uma unidade de saúde foi escolhida como piloto para testar o modelo de assistência proposto, na menor escala possível e, posteriormente, realizou-se a avaliação de sustentabilidade para toda rede. As atividades de construção do projeto tiveram início de outubro de 2019 e nem todas as ideias de mudanças foram implantadas até o momento, devido ao impacto da pandemia de COVID 19 no cenário brasileiro. Estabeleceu-se então a relação entre atenção primária, atenção secundária e enfermeira de ligação, a partir da contratação da enfermeira especialista em obstetrícia pelo hospital localizado na zona sul de São Paulo. A primeira medida da enfermeira de ligação foi a confecção junto a secretaria de saúde do município de São Paulo de um protocolo para Diabetes Gestacional com maior sensibilidade e em conformidade ao consenso elaborado pela Organização Pan-Americana de Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS), Ministério da Saúde, Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO) e da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) para rastreamento e diagnóstico de Diabetes Mellitus na gestação no Brasil. Concomitante, foi aplicada a estratégia de Brainstorming nas equipes do hospital e unidade de atenção à saúde com objetivo de conhecer o cenário atual no manejo da doença e desenvolver novas ideias para construção do projeto. Cabe salientar que as gestantes diagnosticadas com a doença também fizeram suas contribuições para construção do projeto. A partir das ideias coletadas, a Enfermeira de Ligação organizou-as em um Diagrama Direcionador que estabelecia as seguintes diretrizes: 1. Fortalecer a Integração na assistência a gestantes com DMG, 2. Tornar efetivo o serviço de referência e contrarreferência, 3. Reorganizar o modelo de atenção a gestante com DMG com foco na integralidade dos sistemas, 4. Aperfeiçoar a prática profissional da equipe multiprofissional por meio da integração dos serviços. Na sequência, dois eixos principais foram definidos a fim de evidenciar o impacto da Enfermeira de Ligação na assistência ao diabetes: 1) Monitoramento das gestantes com diagnósticos de Diabetes Mellitus Gestacional 2) Monitoramento de todas as gestantes da unidade como método de barreiras para falha no diagnóstico de DMG. Para que o Eixo 1 fosse colocado em prática, foram definidos indicadores específicos relacionados a doença que passaram a ser monitorados mensalmente pela Enfermeira Obstetra de Ligação. As gestantes são avaliadas através dos seguintes indicadores: 1) Engajamento a Dieta; 2) Engajamento a atividade física; 3) Controle Glicêmico; 4) Ganho de Peso na Gestação; 5) Crescimento fetal (altura uterina x idade gestacional). Mensalmente é realizada uma reunião virtual entre a equipe de Enfermagem da unidade piloto, incluindo lideranças regionais, e enfermeira de Ligação onde todos os riscos são analisados e estratégias individualizadas são definidas para cada caso. Assim elas são acompanhadas do momento em que receberam o diagnóstico de DMG até o desfecho. Com relação ao eixo 2, que nesse momento se encontra em processo de construção, estamos trabalhando na confecção do baseline falha em diagnóstico de Diabetes gestacional na unidade piloto para que possamos ter parâmetro após intervenção da Enfermeira de Ligação. Quando iniciado a construção do projeto em 2019, a unidade não dispunha de sistema informatizado para obtenção dos dados. Além disso, os registros manuais em prontuários eram falhos, portanto não comtemplavam os dados almejados que traduzissem a realidade. Vale ressaltar que para definição do critério “falhas de diagnóstico de DMG” procuramos uniformizar as condutas, porque o critério de rastreio e diagnóstico da doença em 2019 não era o mesmo proposto pela enfermeira de ligação. Em 2020, foi iniciada a implantação do prontuário eletrônico na rede. Para o primeiro semestre de 2020, forte foi o impacto da pandemia para o projeto, sendo necessário priorizar as demandas decorrentes da primeira onda da pandemia no Brasil. No segundo semestre de 2020, implantamos para todas as unidades da rede, a nova proposta de rastreio e diagnóstico de DMG, aquela com maior sensibilidade confeccionada junto a secretaria de saúde do município de São Paulo. Além disso, para evitar falhas no diagnóstico de DMG adotamos medida de contingência através da implantação da estratégia “Pânico para glicemia” onde treinamos a equipe de enfermagem da rede a detectar precocemente glicemias alteradas em gestantes, através desse mecanismo, ações são disparadas a fim de viabilizar o diagnóstico precoce. Sendo assim, atualmente o eixo 1 encontra-se ativo no monitoramento das gestantes com diagnóstico e o eixo 2 em possibilidade de implantação através das parcerias recém adquiridas com a tecnologia da informação e laboratório da rede.
Os resultados alcançados referem-se ao eixo 1. O monitoramento das gestantes com diabetes gestacional tem sido realizado por meio do diagnóstico na unidade. Sendo assim, a taxa de diagnóstico de Diabetes gestacional na unidade piloto em 2019 era de 0,5%. Com relação a esse período, é importante salientar que o rastreamento e diagnóstico do DMG em vigor não eram o mesmo proposto pelo projeto, entretanto traduz achado relevante pela prevalência de DMG no SUS de 18% relatada em literatura. O número de RNs nascidos, de mães com diagnóstico da doença em 2019, era de 50%. Em 2020, as propostas sugeridas por meio do protocolo começaram a ser implantadas na unidade e no hospital. Devido a pandemia, algumas pausas foram necessárias no decorrer do período. Mas, mesmo diante dessas dificuldades, os novos conceitos foram sendo gradativamente incorporados pelo hospital e unidade piloto. Assim, no ano de 2020 a taxa de diagnóstico de DMG aumentou de 0,5% para 4,0% (7;128) e a taxa de RNs com peso adequado para idade gestacional aumentou de 50% para 78,9% (1;15). Em 2021, os dados até setembro contabilizam aumento da taxa de diagnóstico de DMG de 4,0% para 8,3% (128; 183) e a taxa de RNs com peso adequado para idade gestacional expressa diminuição até o momento em relação a 2020 de 78,9% para 58,3% (15/21). Vale ressaltar que em 2019, a taxa de macrossomia na unidade piloto era de 0% na amostra de gestantes diagnosticadas com DMG. Este fato nos chamou atenção, uma vez que esse percentual diverge consideravelmente da prevalência de macrossomia identificada em estudos populacionais (5,3% da população geral; em 15,4% das gestações pós-termo; e em 10% dos casos de obesidade mórbida). Destaca-se ainda que, especificamente associadas ao diabetes, estes percentuais variavam de 28,5 até 48,8%. Neste sentido, espera-se que o percentual de macrossomia comece a ser identificado na amostra de gestantes com diagnosticadas com a doença. Em 2020, os valores subiram de 0% para 10,5% (0;2) de fetos macrossômicos nessa amostra na unidade piloto. E em 2021 de 10, 5% para 11,7% (2;4). Cabe mencionar que mesmo após padronização,entre as unidades referenciadas do hospital, do protocolo de DMG com maior sensibilidade para rastreio e diagnóstico do DMG houve diferença se comparada à aquela monitorada pela enfermeira de ligação. Para essa avaliação, foi selecionada uma unidade “controle” com número de gestantes parecido com o da unidade piloto. A unidade utilizada para comparação apresentou em 2020 uma taxa de diagnóstico de 1%, enquanto a piloto, sob as intervenções da enfermeira de ligação, apresentou 4% de diagnóstico. Acreditamos que este fato possa ter relação com as intervenções propostas no diagrama direcionador proposto no projeto da enfermeira de ligação.
Conhecer o cenário atual de assistência foi fundamental para traçar as metas a serem alcançadas. O projeto é pioneiro no Brasil portanto não há como definir o universo a ser explorado nesse sentido nesse momento. Desenhar o perfil profissional foi o primeiro passo na construção dessa estratégia de promoção de saúde, e, ampliar a visão livre de julgamentos é extremamente fundamental para validar as intenções do projeto e assegurar assistência de saúde excelência. A pandemia afetou a evolução da implantação das ideias de mudança, entretanto, mesmo de forma vagarosa, o espaço conquistado foi exitoso. O baseline de falha de diagnóstico, portanto, será construído e, espera-se que, em breve seja possível ter mais clareza sobre o impacto da enfermeira de ligação na prevenção de falhas de diagnóstico de Diabetes Gestacional. A sensibilidade aumentada do novo protocolo da secretaria municipal de saúde não assegurou que a taxa de diagnóstico da doença fosse a mesma se comparada a unidade piloto com as intervenções da enfermeira de ligação. As principais dificuldades na implantação do projeto estiveram na falta de padronizações de processos entre os níveis de atenção primária/secundaria. O fortalecimento das lideranças dos níveis de atenção primária e secundária no apoio a execução do projeto é fator fundamental para engajamento das equipes envolvidas. O compartilhamento de experiências entre os níveis de atenção favorece o acolhimento e resolução de situações difíceis. O foco da assistência deve estar centrado nas características individuais de cada paciente. Estimular o desenvolvimento dos profissionais de Enfermagem, deve estar em lugar de destaque para quem almeja construir ações de prevenção e promoção de saúde. Existem barreiras sociais, econômicas, psicológicas a serem estudadas no que se refere ao engajamento da gestante com diagnóstico. Diminuir as distancias entre a atenção primária e secundária aparenta ser uma estratégia segura para promover uma assistência holística.

Apresentação