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JOVEM E ADOLESCENTE NÃO COMBINA COM IST´S/ AIDS: CUIDA DE SI E DO OUTRO

Em meados dos anos 2000, através de um levantamento de dados epidemiológicos realizado pelo Programa Saúde na Escola (PSE), a Secretaria Municipal de Educação de Canindé, em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde, percebeu um aumento no número de adolescentes grávidas, bem como de jovens infectados por alguma IST. O trabalho desenvolvido nas escolas até então consistia em palestras em datas pontuais, como no dia de Luta contra a AIDS. A metodologia trabalhada não permitia uma interação maior entre os sujeitos envolvidos. Pudemos perceber também que havia uma grande incidência de partos entre adolescentes no prazo de nove meses após o período carnavalesco. Em Canindé, tradicionalmente, bares, praças, açudes e balneários, se tornam pontos de aglomeração e diversão de jovens e adultos durante esse período.
Nesse contexto, surgiu a necessidade de se trabalhar nas escolas, logo antes do Carnaval, a prevenção às IST´s, o uso da camisinha e, consequentemente, prevenir a gravidez não planejada.
O carnaval acontece após a semana pedagógica, período em que as escolas planejam e/ou reformulam os planos educacionais, contemplando em seu calendário escolar as atividades a serem trabalhadas no decorrer de todo o ano letivo.
No primeiro ano da experiência, antes mesmo do início das aulas, dialogamos com os diretores e coordenadores pedagógicos, afim de firmar parcerias para que as ações do projeto fossem inseridas no calendário das escolas, bem como o planejamento dos dias de orientações sobre as temáticas, junto aos professores.
Já é rotineiro nos primeiros dias de aula as reuniões com os pais nas escolas. Nesse momento, também buscamos espaços para esclarecer junto à família o que seria desenvolvido nas atividades, uma vez que o apoio da família é fundamental. Isso porque estamos situados em um município que tem no turismo religioso sua principal fonte de renda. Canindé tem destaque internacional pela sua romaria, que a nível Franciscano é considerada a segunda maior do mundo. A primeira é a de Assis, na Itália, cidade natural de São Francisco. São muitos os valores propagados pela Igreja Católica ao longo dos séculos. O sexo ainda é visto por pessoas de mais idade ou que tem uma tradição religiosa muito forte como algo pecaminoso, sendo extremamente necessário, antes do contato com os alunos, trabalharmos a família, esclarecendo e mantendo uma importante parceria.

A semana com foco na prevenção: preparativos (pré-semana)
Após o momento com a família, trabalhamos, interdisciplinarmente, nas escolas, a temática durante as aulas na semana que antecede o Carnaval. Os profissionais da Unidade Básica de Saúde do território em que a escola está inserida realizou rodas de conversa entre os alunos, em grande parte do 6° e 9° anos, com base nas dúvidas propostas pelos próprios adolescentes.
Nesses encontros com adolescentes foram disponibilizados preservativos e proporcionado o contato com os profissionais de saúde, o que se tornou imprescindível para a realização das etapas que ocorreram após o carnaval.

A semana da prevenção na escola
A semana que antecede o carnaval é o momento para as ações serem realizadas com os alunos. As escolas trabalham de forma interdisciplinar. Os professores, que acompanham e poiam todas as etapas do projeto, planejam coletivamente e ministram suas aulas de forma contextualizada. O tema deve ser abordado durante toda a semana através de atividades como produção textual, pesquisas, trabalhos artísticos (apresentações teatrais, musicais, danças, pinturas, charges, poemas, poesias, entre outros) e um dia com a presença dos profissionais do Programa Estratégia Saúde da Família do território onde está situado a escola.
Busca-se que durante essa semana sejam sanadas as principais dúvidas sobre sexo seguro, uso do preservativo e, em algumas escolas, através da parceria com a Autarquia de Trânsito Municipal, também são realizados trabalhos educativos sobre a prevenção de acidentes, principalmente relacionadas ao uso do álcool associado a direção.
Na sexta-feira, as escolas realizam o momento da culminância do projeto, na maioria das vezes com atividades lúdicas e festivas, enfatizando sempre a abordagem feito durante a semana.
Disponibilizamos para as escolas preservativos e ainda fazemos uma ampla divulgação dos pontos onde as camisinhas serão distribuídas durante o período carnavalesco. As ações sobre a temática da sexualidade e prevenção às IST´s/AIDS iniciam nesse período, e tem prosseguimento das atividades com metodologias e abordagens diferenciadas.

O dia da culminância
Na sexta-feira da semana da prevenção, após serem trabalhadas de forma interdisciplinar a questão das IST´s, é promovido nas escolas o pré-carnaval, com atividades culturais e artísticas, apresentações de teatro e paródias, organizadas e desenvolvidas pelos próprios alunos. As escolas têm liberdade para estabelecer qual metodologia adotar e algumas escolas convidam a família para prestigiarem a culminância. É um momento que aborda o viés educativo ao lado do entretenimento. Nas escolas da zona rural percebemos um maior entrosamento da comunidade durante o evento.
Temos escolas que priorizam o Conto de Carnaval, em que alunos de diferentes anos abordam a temática do carnaval atrelada à prevenção de doenças, e ao uso do preservativo, levam através do humor a mensagem educativa aos colegas, numa linguagem de adolescente para adolescente. Outras escolas optam por fazer jogos de perguntas e respostas (quiz) sobre o assunto abordado na semana. Outras ainda fazem bailinho de carnaval, com paródias das marchinhas de carnaval e os hits atuais. Os adolescentes participam ativamente do planejamento e execução das atividades.
O principal intuito do dia da culminância é a integração entre todos que trabalharam a temática dentro da escola, um momento em que as diferentes experiências se juntam, de forma lúdica, para enfatizar que a prevenção, o autocuidado e o cuidado com o outro são fundamentais. Esclarecemos aos adolescentes que já tem vida sexual ativa e os que estão prestes a iniciar, a importância de um sexo seguro.
Dessa forma, esperamos que, finalizadas as atividades e iniciado o carnaval, os adolescentes possam aproveitar as festividades de forma a não colocar sua saúde em risco.
No decorrer do projeto foram muitos os êxitos, mas também tivemos muitas dificuldades. O município tem localidades situadas na zona rural, o que dificultava o acesso às escolas, sobretudo durante a quadra invernosa. Outra dificuldade, principalmente no início do projeto, foi relacionada a algumas famílias que não participaram dos momentos e/ou não estavam abertas a conversar sobre sexo com os seus filhos. Aos poucos, no entanto, fomos conquistando espaço e sensibilizando as famílias.
Foi a primeira vez em Canindé que, além de se trabalhar com adolescentes, buscou-se também trabalhar junto à família, contemplando o assunto de forma contínua, pois, passados dois meses do carnaval, é realizado um novo trabalho para acompanhar os jovens que tenham se exposto a alguma situação de risco, encaminhando-os para a realização de exames clínicos, inclusive a sorologia HIV/AIDS.
O principal foco do projeto é a prevenção, mas também sabemos que em casos de exposições a situações de risco é fundamental um diagnóstico e encaminhamento ágil. Sabemos que é preciso fortalecer ainda mais as ações e os vínculos entre os profissionais de saúde com os profissionais da educação, bem como implementar ações de acesso mais descentralizado de distribuição de preservativos e ao exame anti-HIV/AIDS.
Necessitamos também fortalecer essas ações na zona rural, nas áreas de difícil acesso, pois compreendemos que nessas áreas é ainda mais importante um trabalho educativo, pois o acesso a informação e a formação é mais restrito.
O trabalho com adolescente proporciona uma nova abertura de diálogo. Aproximar a equipe de saúde dos adolescentes faz com que outras temáticas além de sexualidade possam ser abordadas.

Lições Aprendidas
• Descentralizar as ações de orientação, buscando alcançar de forma integrada o máximo de crianças e adolescentes, tratando dos mesmos assuntos, mas adaptando-os às diferentes faixas-etárias;
• Divulgar as atividades não só antes, mas também durante e depois de realizadas, para motivar e envolver a comunidade em que a escola está inserida a serem apoiadores e multiplicadores do projeto.

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