APSREDES

Da minha família para a sua família: A implementação do Bolsa Família Municipal em Indiaroba, SE.

Autores do relato:

Bruno Lessa Pereira brunolessatc@gmail.com


Adinaldo do Nascimento Santos adinaldonascs@gmail.com


Contextualização

O município de Indiaroba localiza-se na Mesorregião Leste Sergipano, no extremo Sul do Estado, a 110 km da capital Aracaju e a 210km da capital baiana Salvador, com seus limites territoriais dos Municípios de Estância, Cristinápolis, Umbaúba e Santa Luzia do Itanhy, além dos municípios baianos Jandaíra e Rio Real. Com 316,316 km² em extensão territorial e 18.337 habitantes (IBGE, 2021), Indiaroba se destaca em Sergipe pelas suas riquezas naturais, pela cordialidade de seus habitantes e também pela produção de frutas, legumes e verduras provenientes da Agricultura Familiar. Por quase um século, Indiaroba foi território alvo de disputas de comarca entre os municípios de Abadia ao lado da Província da Bahia e Santa Luzia do Rio Real (hoje Santa Luzia do Itanhy) do lado de Sergipe. O município foi marcado por diversas influências culturais, em destaque: a atuação da igreja católica, que no século XVIII providencia a construção de espaços como a Capela de Nossa Senhora de Carmo (hoje Povoado Convento) e a colonização francesa, povo apontado como os primeiros etnicamente brancos a aportarem na região, onde, com auxílio dos navios, contrabandeavam madeira e outras riquezas naturais. Dados do Censo Demográfico de 2010 apontam uma melhora no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de Indiaroba entre os anos 2000 e 2010, de 0,380 para 0,580). Com uma renda per capita média de R$220,89, Indiaroba apresenta apenas 42,2% da renda per capita do estado de Sergipe, que é de R$523,53 (EMDAGRO, 2019). O vínculo do município com a Agricultura Familiar têm suas raízes fincadas na importância histórica, cultural, econômica e política da produção de alimentos, destacadamente a partir da década de 1990, com os avanços alcançados a partir da atividade do Movimento sem Terra (MST), ponto decisivo no fortalecimento da Agricultura Familiar Indiarobense. O empenho do Movimento sem Terra (MST) pela distribuição da terra no município ganhou forças em 1996 com a implementação do Assentamento Sete Brejos. Consolidado após 18 meses de acampamento, o caso do Sete Brejos foi o estopim necessário para o avanço da distribuição das terras anteriormente ociosas. Desde então, o território de Indiaroba passa a ser devidamente distribuído entre as famílias que praticam a AF em 45 comunidades de assentados rurais, em destaque: a Colônia Sergipe, a Terra Caída, a Colônia Retiro e o Pontal. Indiaroba contou com o apoio do Governo do Estado e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária de Sergipe (INCRA-SE) no desenvolvimento de projetos de assentamentos rurais, sendo as Colônias Sergipe e Retiro originárias de projetos promovidos pelo Governo do Estado de Sergipe e outras quinze comunidades assentadas implantadas através do INCRA-SE. É no seio da da busca por melhorias e incentivos que nasce a necessidade de organização dos agricultores em Cooperativas e Associações, especialmente a partir dos anos 2000. Hoje, Indiaroba conta com duas cooperativas de Agricultores Familiares: Cooperativa de Produção, Comercialização e Prestação de Serviços dos Agricultores Familiares de Indiaroba e Região LTDA – COOPERAFIR e a Cooperativa Ecológica de Comércio Justo – COOPECOJU, além de dois sindicatos: Sindicatos dos Trabalhadores Rurais de Indiaroba e Sindicato dos Produtores Rurais de Indiaroba. Como fruto dessas raízes, deve-se salientar o protagonismo da produção de alimentos provenientes da Agricultura Familiar como principal atividade econômica do município. A produção de frutas, legumes e verduras realizada pelos Agricultores Familiares assentados é diversa, mas se destaca a produção de laranja, abacaxi, coco da baía, banana, maracujá e mandioca. Os agricultores comercializam seus produtos em diversas ações com feiras livres, a venda para atravessadores em todo o estado e também no Programa de Aquisição de Alimentos e no Programa Nacional de Alimentação Escolar, considerados essenciais para a manutenção da produção agrícola no município (EMDAGRO, 2019). Além disso, existe a comercialização dos pescados artesanais, comumente desempenhada por pescadores e marisqueiras extrativistas que utilizam os recursos naturais dos manguezais, rios e estuários para sua sobrevivência. Outra prática muito importante para o município é o turismo de Base Comunitária, baseado na prática de atividades recreativas manifestadas pelas comunidades que buscam no turismo uma possibilidade de renda e desenvolvimento social. Atualmente, há cerca de 7000 agricultores familiares no município, além de diversos pescadores, marisqueiros e extrativistas. Além disso, Indiaroba se destaca por ter como prefeito o Sr. Adinaldo Santos, Agricultor Familiar, Assentado Rural e produtor de frutas orgânicas, além de contar com Agricultores Familiares em outros pontos da sua estrutura político-administrativa, como na Câmara de Vereadores e nas Secretarias Municipais, o que têm se mostrado determinante para o desenvolvimento da agricultura familiar no município. INSTITUTO BRASILEIO DE GEOGRAFIA E PESQUISA (IBGE). Panorama do município de Indiaroba, SE. Acesso em: 17 de Setembro de 2021. Disponível em: EMPRESA DE DESENVOLVIMENTO AGROPECUÁRIO DE SERGIPE (EMDAGRO). Série de Informações Básicas Municipais: Série Junho/2019 – Indiaroba. Acesso em: 17 de Setembro de 2021. Disponível em:

Justificativa

Ao perceber a existência de famílias em extrema pobreza que não eram contempladas pelo Bolsa Família Federal, levantou-se a necessidade de criar um programa que pudesse preencher as lacunas existentes no município em relação ao acesso de todos a uma alimentação saudável e adequada. Dados do Censo Demográfico de 2010 apontam que 52,8% da população Indiarobense possuem rendimento nominal mensal per capita de até 1/2 salário mínimo (IBGE, 2021), o que configura um desafio para o acesso integral à alimentação adequada por estas famílias. Visando remediar a vulnerabilidade enfrentada por estas pessoas e fomentar a Segurança Alimentar e Nutricional do município, a Prefeitura de Indiaroba, através da Lei n° 620 de 18 de Dezembro de 2020 cria o Bolsa Família Municipal, que visa a transferência de renda (via cartão magnético) inicialmente para cerca de quinhentas famílias residentes no município que se encontram em situação de vulnerabilidade social, pobreza e extrema pobreza vinculadas ao CadÚnico do município. O programa é gerenciado pela Secretaria Municipal de Inclusão e Desenvolvimento Social e o valor do benefício a ser repassado mensalmente pelo Programa Bolsa Família Municipal, será, inicialmente de R$100,00 (cem reais) por família. O diferencial desta iniciativa reside em dois aspectos importantes: o benefício não poderá ser sacado; o cartão magnético é habilitado para ser utilizado apenas nas máquinas de débito que serão repassadas para 30 microempreendedores que atuam no comércio de alimentos (como mercados, açougues, dentre outros) e para 22 agricultores que comercializam seus produtos diretamente na feira da Agricultura Familiar de Indiaroba. O estímulo ao o curto circuito de comercialização e ao escoamento da produção dos agricultores para os beneficiários do Bolsa Família é algo pioneiro no municipio. Considerando que fome e a falta de acesso ao alimento jamais deve ser admitida em uma gestão pública, a gestão pública de Indiaroba possibilitará que as famílias atendidas tenham acesso a alimentação através da utilização dessa renda, minimizando os efeitos da pobreza ao mesmo tempo em que otimiza o acesso a frutas, legumes e verduras produzidos pela agricultura familiar. Além disso, o Programa visa incentivar o comércio local, a agricultura familiar e os curtos circuitos de comercialização. Compreendendo a importância dos assentamentos da reforma agrária que abastecem, através da agricultura familiar, os entrepostos urbanos, mas que, ao mesmo tempo, são fragilizados por não atender às demandas organizacionais do mercado competitivo, por sofrer com o escoamento da produção e para adquirir o sustento da família, a Secretaria beneficia também os agricultores e empreendedores locais ao credenciá-los no Programa. Ao determinar que a utilização do recurso repassado às famílias deve ser feita de forma exclusiva dentro dos limites do município, nas mãos dos produtores e pequenos empreendedores, boa parte das fragilidades que comprometem esses trabalhadores poderá ser minimizada. Além dos efeitos positivos que ocorrem durante a execução do programa, a experiência com o mesmo, assim como o conhecimento adquirido nas capacitações e implementação de uma nova tecnologia de venda, poderá favorecer a autonomia dos agricultores e microempreendedores em outros contextos profissionais. Neste contexto propomos esta ação sustentável e inovadora, conduzida para distribuição de renda, contribuindo para superação da vulnerabilidade social e insegurança alimentar e nutricional das famílias atendidas no Programa Bolsa Família Municipal, por meio do consumo de frutas, verduras e legumes vindos da agricultura familiar de Indiaroba.

Objetivo

1 – Ampliar as possibilidades de elevação dos níveis de qualidade de vida e, consequentemente, de melhoria do índice de desenvolvimento das famílias em situação de extrema pobreza por intermédio da transferência de renda. 2 – Possibilitar o desenvolvimento econômico e sustentável do município ao condicionar o gasto do benefício em vendas de alimentos credenciados e capacitadas, dentre eles, a Feira da Agricultura Familiar. Ou seja, o programa possibilitará que as famílias (titulares de direitos que receberão o valor) apoiem o trabalho de outras famílias (os agricultores) ao mesmo tempo em que consomem frutas, legumes e verduras da melhor qualidade, produzidos no próprio município.

Metodologia

Criação da Lei: A Lei Municipal nº 620, de 18 de dezembro de 2020 cria o programa Bolsa Família Municipal e traz as prerrogativas para a sua execução, bem como, assegura o montante de R$600.000 para repasse às famílias beneficiárias em parcelas mensais de R$100,00 no período de um ano a partir do início da execução. Seleção dos beneficiários: Participarão do programa 500 famílias que atenderem aos seguintes critérios: Famílias que residem no município há no mínimo 2 anos; Ter renda per capita mensal de R$100,00; Estar com seus dados atualizados no cadastro único dos programas sociais do governo federal. O cadastramento foi realizado através de visitas domiciliares pelas assistentes sociais que atuam à frente dos benefícios de transferência de renda administrados pela Secretaria de Inclusão e Desenvolvimento Social do município. Para viabilizar o início do programa, uma empresa foi selecionada por meio de processo licitatório para a administração dos processos que envolvem a confecção dos cartões, das máquinas e também para a gestão das movimentações financeiras do recurso repassado através das compras foi selecionada por meio de processo licitatório. Capacitação e seleção dos Agricultores Familiares e dos Microempreendedores: Neste momento, foram credenciados e capacitados 22 agricultores familiares que vendem seus produtos na Feira da Agricultura Familiar e 30 microempreendedores individuais (MEI) que atuam no comércio local de alimentos. Cada grupo passou por dois encontros para apresentação da proposta e para apresentação da máquina habilitada para receber os recursos contidos no cartão magnético do Bolsa Família Municipal. Neste momento, estavam presentes os órgãos responsáveis pelo programa – a Secretaria de Inclusão e Desenvolvimento Social e a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, além da empresa responsável pela mobilização e logística dos empreendedores e agricultores, e os representantes da empresa contratada para produção dos cartões e da máquina. Execução: O programa será lançado em Setembro de 2021 e iniciará a sua execução na primeira quinzena de Outubro de 2021. O programa terá duração inicial de 12 meses. Acompanhamento: O monitoramento das compras feitas pelos beneficiários será realizado pela empresa credenciada para confecção dos cartões e das máquinas, que também serão responsáveis pela movimentação dos recursos financeiros para os empreendedores e agricultores que serão portadores das máquinas. A empresa irá repassar relatórios mensais para a Prefeitura, que irá acompanhar o andamento do programa durante a sua execução. Além disso, os beneficiários serão acompanhados pela Secretaria de Inclusão e Assistência Social para entender as mudanças que o programa irá proporcionar na vida das famílias em extrema pobreza, principalmente em relação ao acesso à alimentação.

Atores envolvidos (institucionais e/ou coletivos)

Prefeitura de Indiaroba; Secretaria Municipal de Inclusão e Desenvolvimento Social; Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico; Secretaria Municipal de Saúde; Empreendedores municipais; Agricultores Familiares.

Estratégias

A formalização da Lei Municipal nº 620, de 18 de dezembro de 2020, e sua transição no legislativo municipal, foi a principal estratégia traçada para assegurar o recurso e a execução do programa. A partir deste ponto, foram empregadas as atividades necessárias para adiantar ao máximo o acesso das famílias ao benefício.

Resultados alcançados

O programa será oficialmente lançado no dia 28 de Setembro de 2021, numa cerimônia oficial para a entrega dos cartões para os beneficiários. O início da execução está previsto para a primeira quinzena de Outubro de 2021 e neste momento, os beneficiários receberão a primeira parcela do benefício e os microempreendedores e agricultores receberão as máquinas utilizadas para captação do recurso no momento da compra, bem como as orientações finais para utilização da tecnologia. Serão movimentados no período de um ano R$600.000 para os agricultores familiares e empreendedores dentro do município. Após o primeiro ano de execução do programa, serão agregadas mais 300 famílias ao escopo do programa, o que será determinante para o acesso à alimentação adequada e saudável por parte dessas famílias.

Considerações finais

Diante do contexto nacional de agravamento da vulnerabilidade socioeconômica, e da insegurança alimentar e nutricional, o desenvolvimento de um programa como o Bolsa Família Municipal é uma ferramenta inteligente para proteger os direitos básicos da população em pobreza e extrema pobreza, como o Direito Humano à Alimentação Adequada, ao transferir uma renda que lhe permite acessar produtos de necessidade básica, e mais do que isso, acessar alimentos variados e saudáveis, como as frutas, legumes e verduras. Além de promover o acesso a tais alimentos às famílias beneficiadas, a inovação do Programa é incentivar o comércio local, estratégia que se destaca num momento de crise aprofundada pela pandemia, e especialmente os agricultores familiares, que estão entre os grupos mais afetados na pandemia pelas transformações nas relações comerciais, logísticas e sociais nesse cenário, que limitaram a atividade dos produtores. Sendo assim, possibilita-se melhora no escoamento dos alimentos da AF, como também a capacitação desses agricultores na utilização de tecnologia de comercialização, o que colabora com o sustento desses, e de sua produção de frutas, legumes e verduras, considerando as conexões do sistema alimentar do município. Ao ser colocado em prática, o programa poderá portanto, influenciar a sustentabilidade desse sistema alimentar, ao garantir acesso a alimentos na Feira da Agricultura Familiar e nos estabelecimentos dos MEIs credenciados. Para sobrevivência local, exerce-se, ao existir um destino considerável da matéria prima produzida, como exemplo: A laranja produzida nos assentamentos, é comercializada na Feira da Agricultura Familiar realizada às quintas-feiras na cidade, comprada pelos empreendedores turísticos, também destinada para Programas Federais como o PAA – Programa de Aquisição de alimentos e PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar, atendendo as famílias que passam por insegurança alimentar e nutricional, com Pescadores e marisqueiras ( e seus respectivos filhos), que por sua vez, vendem seus pescados para os empreendedores turísticos locais, destinarem a atividade turística. Pressupõe que as integralidades desses processos unem a acessão sustentável dos recursos naturais produzidos, munidos pela valorização cultural, econômica e social. No futuro, será importante monitorar os dados do programa e realizar estudos para avaliar, de fato, os impactos do programa e seu alcance para as famílias beneficiadas, para os produtores e comerciantes e para a economia local no geral.