Empregando ferramentas que vão desde recursos digitais, como as redes sociais, até a tradicional literatura de cordel, os profissionais da Atenção Primária à Saúde (APS) encontram maneiras de se aproximar dos usuários e de manter o processo de educação permanente, adaptando-se às limitações da pandemia. Três experiências, desenvolvidas na Paraíba, no Piauí e no Espírito Santo, demonstram a capacidade da APS de identificar estratégias e possibilidades para dialogar com a população, fortalecendo as práticas com os meios que estão disponíveis.
As atividades foram apresentadas nesta quinta-feira, durante a live Educação Permanente e Educação em Saúde: Fortalecendo a APS na Pandemia, transmitida pelo Portal da Inovação na Gestão do SUS. Os exemplos foram selecionados entre mais de mil casos inscritos na iniciativa APS Forte no SUS – no combate à pandemia, que estimula o debate e a divulgação de boas práticas da APS no enfrentamento à Covid-19. A ação foi proposta pelo Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de Atenção Primária à Saúde (SAPS/MS) e pela Organização Pan-Americana da Saúde da Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS). As experiências podem ser inscritas até o dia 15 de julho.
A coordenadora da Unidade Técnica de Capacidades Humanas para a Saúde da OPAS no Brasil, Mónica Padilla, que foi moderadora do debate, ressaltou a importância das experiências brasileiras no cenário internacional. “ O conceito de educação permanente para as Américas, praticamente, foi aportado pelo Brasil. Estas experiências não só demonstram o que é educação permanente, mas como é a reação das pessoas, frente à realidade, quando têm em mãos estas ferramentas”.
Na avaliação de Padilla, as ferramentas de diálogo empregadas pela APS no Brasil para manter a conexão entre equipes e usuários comprovam a potência da educação em saúde, assim como a capacidade dos profissionais brasileiros para verem a realidade e atuarem sobre ela.
Para a docente do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia, Isabela Cardoso, que atuou como debatedora, as soluções apresentadas comprovam o valor da APS em um país continental e desigual como o Brasil, em que os profissionais de saúde são desafiados a fazer uma releitura do que têm para responder a um contexto de incertezas impostas pela pandemia. “O legado desta pandemia foi mostrar estas possibilidades, e, ao retornar, retornaremos mais fortes, com uma apropriação muito maior das tecnologias, porque aprendemos a nadar sendo jogados no fundo, quebramos algumas resistências e, principalmente, identificamos estratégias que fazem com que as pessoas possam ter maior acesso a este conjunto de informações”.
Caldas Brandão, a 60 quilômetros da capital paraibana, suspendeu os atendimentos clínicos eletivos presenciais desde do dia 23 de março. A partir de então, os profissionais do NASF foram inseridos em ações de combate à pandemia e no serviço de teleatendimento. Naquele momento, conforme o relato da educadora física do NASF-AB da SMS Caldas Brandão – PB, Laís Castro, era preciso encontrar meios para realizar um trabalho educativo que colaborasse com o enfrentamento à pandemia, sem a realização de ações coletivas presenciais.
A alternativa escolhida foi a utilização de redes sociais, principalmente o Instagram – rede de maior alcance no município – para divulgar informações e restabelecer a conexão entre os usuários e a APS.
Para chegar de forma efetiva até o público, os profissionais elaboraram a Estratégia #QUARENTENASF. O projeto consiste na criação de uma programação diária fixa, com a escolha de uma linguagem simples e marcadamente visual. O desenvolvimento ocorre de forma articulada com outros setores públicos, como educação, assistência social e igrejas. Os usuários interagem por meio das ferramentas da plataforma: stories, inbox e comentários. As ações são planejadas articulando interações com a comunidade e as demandas da APS.
Os resultados da ação são mensurados pelo número de seguidores e pela interação e compartilhamento dos usuários. Na data da apresentação, a Saúde de Caldas Brandão contava com mais de 1,3 mil seguidores no Instagram. Cada publicação alcança em torno de 700 pessoas.
Na avaliação de Castro, os legados do trabalho com educação em saúde nas plataformas virtuais durante a pandemia foram: o desenvolvimento do olhar de complexidade para o processo de saúde e adoecimento; a reafirmação da relevância da equipe multidisciplinar no fortalecimento da APS; a constatação do ambiente virtual como campo para o trabalho de educação e promoção em saúde; o protagonismo, a cooperação e a criatividade como elementos decisivos para o sucesso de educação em saúde na APS.
A formação dos profissionais de saúde no Sul do Espírito Santo iniciou antes da pandemia, ainda em 2019, com processos educacionais voltados para uma concepção crítico-reflexiva e para a aplicação de metodologias ativas, estimulando a participação e o comprometimento com os objetivos de aprendizagem. A enfermeira Mirela Dias Gonçalves, facilitadora no Projeto Qualifica ES, contou que houve uma mudança das práticas profissionais na APS, a partir da qualificação das equipes para a educação permanente, e que o cenário de pandemia representou uma oportunidade para novos aprendizados.
Desde o surgimento da Covid-19, o grupo se readaptou, adotando recursos tecnológicos de comunicação para continuidade do processo formativo dos profissionais. Mesmo com o distanciamento social, os encontros foram mantidos e passaram a ser realizados em ambientes virtuais com horários protegidos, dentro da jornada de trabalho, intercalados com estudos dirigidos.
Segundo Gonçalves, uma das inovações que apresentaram melhores resultados foi o exercício da escuta ativa por tutor, com a finalidade de acolher os profissionais de saúde e estabelecer uma relação de proximidade no ambiente virtual.
As abordagens pedagógicas foram voltadas à valorização do saber e à aprendizagem significativa, como espaço de compartilhamento de experiências e mediação do tutor no processo de ensino e aprendizagem.
A agente comunitária de saúde Maria Marilene do Monte Carvalho utilizou um recurso popular e que tem grande alcance entre os usuários de Pio IX – PI para divulgar informações. Os cordéis passaram a ser uma ferramenta entre as Tecnologias de Informação e Comunicação usadas na APS.
O suporte educacional foi implementado valorizando a sabedoria popular, nos versos de cordéis criados pela agente. Carvalho lembrou que, a partir de março, por causa da pandemia, os usuários passaram a evitar as visitas dos profissionais de saúde, com receio de serem contaminados. Quando ela divulgou os contatos dos agentes comunitários de saúde em um cordel, a população voltou a procurar os serviços de saúde.
Diferente da maioria dos expositores das lives promovidas até agora pelo Portal da Inovação, em que os convidados costumam partilhar apresentações de slides, a agente comunitária de saúde mostrou que é possível inovar até mesmo na forma de realizar debates virtuais, apresentando o projeto da APS de Pio IX na forma de um cordel.
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