Em dezembro de 2019, relatou-se o primeiro caso de infecção de um novo vírus nas províncias de Wuhan, China, causando sintomas da síndrome respiratória aguda grave nos infectados, e apresentando um alto potencial de disseminação (KWOK et al., 2020). O vírus responsável por este surto foi denominado de Severe Acute Respiratory Syndrome Coronavirus 2 (SARS-CoV-2), provocando a doença conhecida como COVID-19 (PENG et al., 2020). Ocorreu uma rápida disseminação do COVID-19 na China e no mundo. A COVID-19 foi declarada uma emergência de saúde pública de preocupação global pela Organização Mundial da Saúde (OMS) (PENG et al., 2020; ZHU et al., 2020).
A transmissão do SARS-CoV-2 ocorre principalmente através de gotículas respiratórias e salivares de pacientes infectados, portanto a atividade odontológica foi considerada uma das mais críticas (BRASIL, 2021). A fim de reduzir a circulação de pessoas, a disseminação do vírus e a sobrecarga dos serviços de saúde, passou-se a utilizar os serviços de Telessaúde com maior ênfase, envolvendo uma interação remota entre os pacientes e os profissionais de saúde (TELLES-ARAUJO et al., 2020; BRASIL, 2021; RAMIREZ et al., 2021). Essa interação ocorreu através do uso das tecnologias de informação e comunicação (TIC), em tempo real de forma síncrona, ou assíncrona, através de mensagens instantâneas (DOS SANTOS PACHECO et al., 2018; TELLES-ARAUJO et al., 2020).
A teleodontologia, um subcampo da Telessaúde, é um serviço remoto de atendimento odontológico, e tem sido recomendada por ampliar as possibilidades de cuidado e para finalidades gerenciais dos serviços de saúde (BRASIL, 2020; KHAN e OMAR, 2013; GIUDICE et al., 2020). Para o contexto do Sistema Único de Saúde, dois importantes documentos fortaleceram as práticas, no caso o Guia de orientações para atenção odontológica no contexto da COVID-19 (BRASIL, 2020) e a resolução CFO-226 (CFO,2020) que institui a teleodontologia em duas modalidades: 1) o Telemonitoramento realizado por Cirurgiões-Dentistas, que consiste no acompanhamento a distância dos pacientes que estejam em tratamento, no intervalo entre consultas, devendo ser registrada no prontuário toda e qualquer atuação realizada nestes termos; 2) a Teleorientação realizada por Cirurgiões-Dentistas com o objetivo de identificar, através da realização de questionário pré-clínico, pressupondo aumento da seguridade clínica e o melhor momento para a realização do atendimento presencial (CFO, 2020).
A literatura evidencia a importância da Teleorientação na pandemia da COVID-19 e o papel dos Cirurgiões-dentistas na inspeção inicial, orientação ao usuário, pré-triagem, organização da demanda espontânea e o fluxo nas unidades para evitar acúmulo dos pacientes em salas de espera (WAKHLOO et al., 2020). Além disso, o Telemonitoramento foi considerado estratégia para limitar as visitas físicas, assim como, fortalecer o uso das visitas virtuais, para monitoramento regular dos resultados do tratamento e progressão de doenças (GHAI, 2020).
A tecnologia transformou diversos aspectos da vida social, inclusive na saúde, onde as ferramentas digitais facilitaram a troca de informações entre profissionais e pacientes, principalmente em decorrência da pandemia da COVID-19. Considerando as profissões de saúde, a Odontologia está dentre as práticas profissionais que precisaram se readequar aos processos de trabalho, com o objetivo de diminuir a disseminação do Sars-CoV-2, causador da Covid-19.
Segundo literatura, o protocolo de atendimento através da teleodontologia durante COVID-19, além de reduzir custos para os usuários e serviços de saúde, contribuiu para conter a infecção cruzada e possibilitar ao usuário a sensação de segurança de ser constantemente monitorado e de participar ativamente do processo de cura. O Telemonitoramento contribuiu e fortaleceu a relação profissional e paciente, aumentando a adesão do paciente ao tratamento (SILVA et al, 2022).
Além disso a teleodontologia demonstrou ser uma excelente ferramenta de controle e atendimento à pacientes. Num estudo realizado com 237 pacientes idosos, com objetivo de avaliar a precisão da teleodontologia no diagnóstico de patologias dentárias, demonstrou que a teleodontologia apresenta uma excelente acurácia, com uma precisão de 95,2% (QUEYROUX et al., 2017). Além disso, outros estudos demonstram que a teleodontologia tem sido uma excelente opção mediante a situações adversas como distância geográfica, clima ruim, falta de transporte público (WOOD et al., 2016; GIUDICE et al., 2020). Demonstrando que uso da teleodontologia dever ir além da pandemia de COVID-19.
Desta maneira, este estudo está em aderência com o edital do Laboratório de Inovação em Saúde (LIS) para a Política Nacional de Saúde Bucal – Brasil Sorridente, uma vez que, a experiência a ser relatada demonstra o fortalecimento do uso da teleodontologia, durante a pandemia, do município de Palhoça/SC, e poderá suscitar discussões sobre a adoção desta importante estratégia de mapeamento em saúde pública neste município.
O objetivo geral foi descrever a experiência serviço de teleodontologia no município da Palhoça/SC durante a pandemia do COVID-19.
Objetivos específicos:
• Descrever características demográficas dos usuários
• Descrever a presença de sintomatologia para COVID-19
• Quantificar o número de teleatendimentos e consultas agendadas;
• Descrever a prevalência das principais queixas de saúde bucal;
• Mapear as Unidades Básicas de Saúde com número de agendamentos do município de Palhoça/SC.
O serviço de teleodontologia durante a pandemia a COVID-19 do Município Palhoça teve início em maio 2020 e foi finalizado em setembro de 2021 e contabilizou 20.900 usuários. O serviço se caracterizou pela disponibilização de um único número de telefone para os teleatendimentos (via WhatsApp) ao paciente que procurava a Unidade Básica de Saúde (UBS) de sua referência.
O teleatendimento constituiu-se, incialmente, de mensagens para identificação sociodemográfica do paciente, seguida do envio, pelo usuário, da queixa de maneira virtual, por vídeo ou foto. Em seguida os profissionais questionavam sobre exames existentes para compor o diagnóstico. As mensagens eram sempre feitas por texto. Ao final do teleatendimento, em caso de urgência, o paciente era agendado para o Centro de Especialidades Odontológicas (CEO) ou para sua UBS de referência, no caso da ausência de vaga, ele era encaminhado para outra UBS, caso tivesse disponibilidade de deslocamento.
Todos os dados foram registrados numa planilha do serviço de teleodontologia da Secretaria Municipal de Saúde do Munícipio da Palhoça e, consta de dados referentes ao perfil sociodemográfico do paciente, o qual está descrito a idade (data de nascimento) e sexo (masculino/feminino), além do relato da presença de sintomas relacionados à COVID-19 (sim/não). Para a queixa principal de saúde bucal foram registrados os agravos e condições bucais relatadas, consulta agendada (sim/não), UBS de referência.
Os dados coletados foram organizados, tabulados e analisados a partir de estatística descritiva. Para o mapeamento das Unidades de Atendimento (UBS/CEO), o software Excel foi utilizado.
Até o presente momento foram avaliados dados de 3714 usuários, no ano de 2020, que utilizaram o serviço de teleodontologia, taxa de resposta de 18%. Segundo Tabela 1, 61% dos usuários eram do sexo feminino, a faixa etária mais prevalente dos usuários do serviço foi 20 a 44 anos e 54,3% não declarou se apresentava sintomas para COVID-19.
Dentre as amostras coletadas no ano de 2020, foram realizados 3714 teleatendimentos entre o mês de maio até o mês de outubro. O qual houve 1262 encaminhamentos, ou seja, 33,86% dos pacientes atendidos tiveram sua consulta agendados para a UBS de referência ou CEO.
A principal queixa relatada pelos usuários foi referente à dor (37,6%), seguido por monitoramento de caso (16,7%), que consiste no acompanhamento do paciente que já foi atendido em algum momento, ou que está sob monitoramento devido ao isolamento da COVID-19. Em menor proporção observou-se Trauma ou fratura dental (7,3%), cárie ou cavidade (5,7%), exodontia (5,6%) e troca ou reparo de restauração (5,5%).
Com a realização do mapeamento das unidades de referência para atendimento com a proporção de agendamentos, observou-se uma predominância de agendamentos na região Central do Município. Ao estratificar pelos serviços observou-se maior número absoluto de encaminhamentos para o Centro de Especialidades Odontológicas (CEO), seguidas pelas Unidades básicas Central e Bela Vista. O maior número absoluto para o CEO pode ser justificado pelo fato de que majoritariamente, no ano de 2020, as demandas eram encaminhadas para tal serviço.
Os resultados do presente relatório demostraram que, durante os meses avaliados, a teleodontologia foi efetiva na identificação das queixas e indicação dos serviços. Dentre as queixas, a dor foi a mais predominante, o que se pode inferir que a teleodontologia possibilitou um encaminhamento resolutivo para esses usuários.
A princípio, o motivo da implementação da teleodontologia no Município da Palhoça foi, durante a pandemia do COVID-19, garantir atendimento odontológico à população. Entretanto destacam-se inúmeros os benefícios que esse sistema de avaliação/ agendamento/ monitoramento proporcionou, além de possibilitar ao usuário a segurança de ser monitorado e seu processo de cura, uma proximidade da relação profissional/usuário. Tais atendimentos permitiram uma ideia de diagnóstico, e assim facilitar e agilizar a conduta clínica, economizando tempo e recursos, tanto para o serviço quanto para o paciente.
Atualmente aparelhos de smartphones estão disponibilizados para cada UBS e estão sendo utilizados pelos Cirurgiões-dentistas e auxiliares de saúde bucal. A perspectiva futura para o Município é de um sistema de teleodontologia para marcação de consultas, esclarecimentos, envio de exames e avaliações de alguns casos, com a possível utilização de um software/programa de monitoramento de todas as Unidades Básicas de Saúde para controle quantitativo demográfico e epidemiológico.
Como dificuldades/limitações, o serviço foi implementado com caráter provisório e em função da pandemia da COVID-19 e, não havia recursos específicos para sua funcionalidade em larga escala. Faltaram smartphones, computadores e profissionais para regulação dos atendimentos. Contudo, é uma estratégia de atendimento que deve ser aprimorada e ampliada para que os gestores valorizem a ideia de manutenção do serviço e priorizem recursos e estratégias para sua ampliação.
