A Organização Mundial de Saúde descreve a utilização da tecnologia de informação e comunicação como uma forma segura e efetiva para apoiar a saúde. Em tempos de pandemia, estas tecnologias têm se mostrado ferramentas possíveis como alternativas de atendimento, sendo viável para garantir o acesso à rede de saúde pelos pacientes. O Conselho Federal de Odontologia, por meio da resolução CFO nº 226, de 04 de junho de 2020, regulamentou a Teleodontologia no Brasil, sendo que permanece vedado o exercício da Odontologia à distância para fins de diagnóstico, prescrição e elaboração de plano de tratamento odontológico. No entanto, existe a possibilidade de utilização de tecnologias nas práticas odontológicas através da teleorientação, visando o acompanhamento de grupos prioritários, na perspectiva da vigilância em saúde.
O município de Curitiba possui uma ampla rede de saúde bucal com 108 unidades de saúde com clínicas odontológicas, dois Centros de Especialidades Odontológicas (CEO) e atendimento hospitalar em hospital próprio e em hospitais contratualizados. A rede atende uma população de aproximadamente 2.000.000 de pessoas, sendo todo território coberto por equipes de saúde bucal.
O Protocolo de Saúde Bucal da Secretaria Municipal da Saúde de Curitiba tem como algumas de suas metas para a odontologia o acompanhamento dos grupos prioritários que são de 100% das gestantes, 70% das crianças de 0 a 24 meses e 70% das crianças de 5-6 anos do território de cada Unidade de Saúde.
Com a chegada da Pandemia do COVID-19 no Brasil em março de 2020, ocorreu uma ampla restrição no atendimento presencial eletivo em todos os serviços odontológicos de Curitiba. A proximidade profissional/paciente, o ambiente bucal que é fonte de contaminação e disseminação do vírus e a possibilidade da geração de aerossóis no atendimento odontológico foram determinantes para esta restrição.
Diante deste cenário o trabalho de acompanhamento dos grupos prioritários ficou momentaneamente suspenso, o que motivou este serviço de teleorientação. Manter contato com os pacientes foi fundamental para que os agravos bucais fossem minimizados.
A teleorientação realizada teve dois principais objetivos: 1) Identificar as necessidades urgenciais/inadiáveis dos pacientes e, se necessário, agendar estas situações para a clínica odontológica e 2) Realizar o autocuidado apoiado. Ao manter contato com as pessoas dos grupos priorizados as equipes puderam reafirmar as orientações e cuidados para manutenção da saúde bucal das famílias.
Inicialmente foi desenvolvido um protocolo para as equipes de saúde bucal, onde foram descritos os conceitos e procedimentos de emergência, urgência e inadiáveis, para guiar o que atender em tempos de pandemia, baseado em materiais nacionais e internacionais. Este protocolo continha ainda orientações de como proceder nos atendimentos e roteiro para a teleorientação.
As equipes de saúde bucal entravam em contato com os grupos prioritários através de telefone e realizavam este acompanhamento. Além da captação dos pacientes que procuram a Unidade de Saúde, a teleorientação foi uma ferramenta de auxílio para cumprimento das metas de cobertura aos grupos priorizados pelo Protocolo de Saúde Bucal de Curitiba.
A equipe de saúde bucal se organizou para os atendimentos clínicos e teleorientação de forma alternada, assegurando o atendimento clínico das urgências/inadiáveis. Quando agendados os pacientes com situações inadiáveis, identificados na teleorientação, foram informados que havendo sintomas de resfriado ou infecção respiratória (por exemplo: tosse, coriza, febre, perda de olfato ou paladar, dificuldade para respirar) a equipe verificaria a possibilidade de adiar a consulta para depois do término dos sintomas. Ainda realizaram o encaminhamento para realização de testes e eventual tratamento para as síndromes respiratórias. Todos foram orientados que se possível viessem desacompanhados, evitando aglomeração. Caso precisasse de acompanhante, seria único e o mesmo não poderia permanecer na clínica de atendimento (para crianças e pacientes especiais ficou a critério do CD avaliar a necessidade de acompanhante dentro da clínica).
As equipes de saúde bucal realizaram 4517 teleorientações (Teleconsulta na Atenção Primária) no ano de 2020. Em 2021 foram 3916 teleorientações e em 2022 no primeiro semestre 956 teleorientações (dados do prontuário eletrônico do Sistema E-Saúde de Curitiba). Este trabalho resultou em ampliação na cobertura odontológica ao grupo das gestantes que hoje atinge 74% no 1º quadrimestre de 2022 (dados do E-Gestor do MS). Das crianças de 0 a 24 meses 41% foram acompanhadas e das crianças de 5 e 6 anos 47% (dados do prontuário eletrônico do Sistema E-Saúde de Curitiba).
A cobertura das crianças poderá ser ampliada no decorrer de 2022 visto que o trabalho com estes grupos é escalonado, para que as equipes possam gradualmente atender às famílias, os Centros Municipais de Educação Infantil e as escolas que já retornaram às atividades presenciais.
Houve uma esperada redução nas teleorientações uma vez que ocorreu a retomada dos atendimentos eletivos presenciais.
A prática da odontologia no SUS não havia ainda considerado esta ferramenta do teleatendimento no seu dia-a-dia. Esta experiência demonstrou que no período pandêmico foi fundamental para que as ações de saúde bucal pudessem continuar não só na atenção às urgências, mas também na promoção da saúde.
Ao mesmo tempo, amenizada a crise desta pandemia, a teleconsulta/teleorientação continua a ser grande coadjuvante para o trabalho de acompanhamento dos territórios e das comunidades pelas quais as equipes de saúde bucal são responsáveis. Certamente continuará a ser utilizada contribuindo muito para o seguimento dos pacientes.