A produção familiar de gêneros alimentícios nas áreas rurais e periurbanas garante a oferta cotidiana de alimentos frescos, in natura e minimamente processados tanto para a população rural quanto a urbana. Essa característica é fundamental para promover o abastecimento alimentar e a Segurança Alimentar e Nutricional-SAN regional, uma vez que, conforme recomendando no Guia Alimentar Brasileiro e conforme disposto nas diretrizes da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional-PNSAN, para termos uma alimentação saudável é fundamental o consumo diário de alimentos frescos, adquiridos in natura ou processados minimamente. No entanto, as mudanças ocasionadas pela pandemia da COVID-19 no fluxo de circulação de pessoas e de alimentos entre campo e cidade têm impactado negativamente o abastecimento alimentar e a qualidade da alimentação da população, tornando a população ainda mais vulnerável.
Em vista disso, o atual contexto está demandando políticas públicas, ações coletivas e inovações referentes ao abastecimento alimentar nas áreas urbanas e rurais, tanto para garantir o Direito Humano à Alimentação Adequada- DHAA no campo, rios, florestas e na cidade, quanto para evitar a perda de produção agrícola e aumento da pobreza. Assim, o Instituto de Biodiversidade e Florestas-IBEF/Ufopa, frente ao contexto que vivemos e cumprindo o seu papel institucional, mobilizou parcerias para promover ações que fomentassem o abastecimento alimentar saudável e territorializado, bem como para o fortalecimento da produção familiar e da economia diante dos impactos da pandemia.
A campanha ocorreu em duas fases: na fase 01, durante os meses de Abril e Dezembro, ocorreu a distribuição de 410 cestas agroecológicas para famílias da área urbana e de comunidades quilombolas. Essas cestas foram adquiridas por meio de doações em dinheiro feitas pela sociedade civil, em especial a comunidade acadêmica; na fase 02 houve a distribuição de 400 cestas agroecológicas financiadas por meio de projeto custeado pela organização não governamental Terra de Direito e a distribuição foi direcionada a comunidades quilombolas de Santarém.
A fase 01 ocorreu por meio de ações coordenadas de aquisição e distribuição dos alimentos e outros produtos:
01- Arrecadação de dinheiro para compra de alimentos, máscaras e kits de higiene. A divulgação da campanha, mobilização e arrecadação de fluxo contínuo ocorreram virtualmente meio de mídias e redes sociais. A arrecadação de dinheiro foi feita por meio de transferência bancária e plataforma de financiamento coletivo. Com base na arrecadação semanal era calculada a quantidade de alimentos que seriam comprados. Estimou-se que cada cesta custaria aproximadamente R$ 50,00 (alimentos e insumos- embalagens).
02- Aquisição de alimentos agroecológicos: os alimentos são oriundos da produção familiar regional. A compra de alimentos era feita cada vez que se arrecadava valor suficiente para distribuição de 40 cestas. A compra foi articulada junto com instituições parceiras e representações da Agricultura Familiar e populações tradicionais, conforme interesse e possibilidades das famílias. Era feito contato com as pessoas referências de cada associação parceira. As lideranças faziam contato com as famílias associadas que tinham interesse em fornecer os alimentos para verificar os produtos disponíveis e suas respectivas quantidades. Feito esse levantamento de informações, as pessoas das associações encaminhavam para a coordenação da Campanha a lista de alimentos contendo quantidade disponível e preço. A decisão de compra era pautada nos seguintes critérios: valor em caixa para compra de alimentos agroecológicos; diversidade e a disponibilidade de alimentos disponíveis para serem vendidos naquela semana; logística de entrega e; situação financeira das famílias. Assim, a variedade e quantidade de alimentos dependiam da produção familiar disponível, bem como do valor a ser investido na compra. Geralmente cada cesta pesava aproximadamente 14 kg e continha entre 8 e 15 tipos de produtos, sendo mais recorrentes produtos derivados da mandioca (farinha de mandioca, goma de tapioca), hortaliças ( couve, cheiro verde. maxixe), raízes e tubérculos (macaxeira, batata doce), frutas (banana, banana da terra, laranja, limão, tangerina, sapotilha) e ovos. O grupo responsável pela montagem das cestas fazia o controle da aquisição dos alimentos (quem vendeu qual produto; preço e quantidade; valor a receber) e o pagamento era efetuado no ato da entrega.
03- Distribuição das cestas agroecológicas para famílias em situação de vulnerabilidade social, conforme mobilização feita por entidades/instituições parceiras. As cestas agroecológicas eram organizadas pelo coletivo da campanha (professoras e discente da Ufopa, pessoas de instituições e entidades parceiras e representantes de associações) a partir dos alimentos adquiridos. O dia, horário e local de organização das cestas serão escolhidos de acordo com o que for mais viável e seguro para o grupo fornecedor dos alimentos e para o grupo de montagem das cestas. As cestas continham alimentos, máscara de tecido, cartinha de apresentação; informativos elaborados por discentes e docentes da Ufopa sobre Higienização dos alimentos sobre uso de máscaras e sobre gestão de resíduos sólidos na situação da Pandemia da COVID-19 (GEASA/ICTA) e sobre receitas culinárias utilizando produtos disponíveis na cesta. 150 cestas também foram distribuídas com kits de higiene doados pela FASE e pela Terra de Direitos.
A cada finalização de ciclo de arrecadação, aquisição e distribuição das cestas agroecológicas, era iniciado novo ciclo. Desse modo, a Campanha Alimentando a Vida foi operacionalizada diariamente durante os meses em que ficou ativa.
Durante a fase 02 foi realizada parceria com a organização não governamental Terra de Direitos que financiou a distribuição de 400 cestas agroecológicas para comunidades quilombolas de Santarém (Patos do Ituqui, Arapemã, Saracura, São Raimundo, Nova Vista do Ituqui, Pérola do Maicá), somando aproximadamente 5,8 toneladas de alimentos. As cestas foram compostas por derivados da mandioca, Jerimum, frutas, ovos ou piracuí. Além dos alimentos também foram distribuídos: 400 Kits de prevenção ao coronavírus oriundos do Projeto Omulu (projeto realizado pela Federação das Organizações Quilombolas de Santarám- FOQS em parceria com o Governo do Estado, Terra de Direitos e Ordem Franciscana); materiais informativos sobre a prevenção a COVID-19. Esses materiais foram elaborados por professoras e discentes da Ufopa.
Nessa etapa, a articulação das compras dos alimentos foi realizada pelo Grupo de Trabalho da Campanha Alimentando a Vida e pelas lideranças das associações fornecedoras. A montagem e a distribuição das cestas foi articulada pela Ufopa e pela FOQS e teve apoio logístico da Terras de Direito, do STTR de Santarém e da Ordem Franciscana.
A Campanha Alimentando a Vida foi promovida por um Grupo de Trabalho composto por docentes e discentes de cursos do Instituto de Biodiversidade e Florestas- IBEF, da Universidade Federal do Oeste do Pará- Ufopa, e pela extensionista rural da Emater-PA, escritório local de Santarém, em parceria com associações e cooperativas da Agricultura Familiar regional, com entidades da sociedade civil organizada, e com Organizações Não Governamentais.
Para que a aquisição de alimentos, montagem e a distribuição das cestas agroecológicas fossem organizadas e distribuídas foi preciso o estabelecimento de rede de instituições e entidades. A parceria com as associações, sindicatos, Emater e entidades que atuam no combate à fome e\ou não fortalecimento da Agricultura Familiar foi fundamental para que a campanha fosse concretizada. Durante sua execução, a campanha mobilizou 20 instituições e entidades parceiras, conforme apresentado a seguir.
INSTITUIÇÕES PÚBLICAS: EMATER-PA, escritório local de Santarém.
SOCIEDADE CIVIL ORGANIZADA (associações e cooperativas): Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Santarém- STTR de Santarém, Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Belterra- Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Belterra- Amabela, AMTR, Associação de Agricultoras Familiares de Mojuí dos Campos- Flores do Campo, COOFAM, Associação TAPAJÓS ORGÂNICOS, Casa Familiar Rural- CFR DE BELTERRA, COOPRASU, COLÔNIA DE PESCADORES Z-31, Federação das Organizações Quilombolas de Santarém- FOQS, Conselho Indígena do Tapajós e Arapiuns- CITA, Associação Fuzuê.
ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS: Fase, Terra de Direitos
ORGANIZAÇÕES SOCIAIS: Pastoral Social, Arquidiocese de Santarém, Cáritas, Ordem das Irmãs Franciscanas
EMPRESA: Panificadora MASSABOR
Pessoas não vinculadas a instituições ou entidades: 02
O envolvimento dos atores foi diferenciado conforme as demandas.
A realização da Campanha Alimentando a Vida gerou e continua gerando diversos resultados, dentre os quais destacamos:
– O acesso de famílias em situação de insegurança alimentar e nutricional a alimentos frescos ou minimamente processados (frutas, legumes, verduras, ovos, piracuí e derivados da mandioca): Foram distribuídas 810 cestas agroecológicas, atendendo diretamente 810 famílias em situação de insegurança alimentar e nutricional, incluindo famílias indígenas e quilombolas.
– A geração de renda para famílias por meio da aquisição de sua produção para formação das cestas agroecológicas: Foram comprados aproximadamente 12 toneladas de alimentos, beneficiando aproximadamente 60 famílias fornecedoras dos alimentos, com destaque para mulheres rurais.
– Fortalecimento de associações de mulheres agricultoras;
– Fortalecimento de rede de parceiras em torno da promoção de SAN, da Agroecologia e da Agricultura Familiar.
– Possibilitou o ambiente institucional favorável para promoção de SAN dentro da universidade (em torno de políticas de assistência estudantil como Restaurante Universitário e a elaboração do auxílio alimentação afirmativa);
– Fomentou a busca por conhecimento acadêmico sobre SAN e Agroecologia, sobre a produção familiar.
– Favoreceu o aprendizado sobre venda coletiva de alimentos, sendo base para a venda delivery
– Observamos que a segurança de ter para quem vender é uma demanda das famílias agricultoras parceiras da campanha, assim como ampliar os canais de comercialização. Como desdobramento da campanha (ou derivações) fora iniciada em junho 2020 e continua tendo continuidade a venda de cestas agroecológicas por meio de aplicativo de mensagens (WhatsApp). Com o apoio da Campanha associadas das associações Amabela e Tapajós Orgânicos iniciaram a venda virtual e entrega delivery de seus produtos. A entrega é semanal.
Além disso, a campanha inspirou a Ufopa a lançar como política de apoio estudantil o Auxílio Alimentação Afirmativa. A proposta está sendo elaborada e se aprovada será lançada chamada pública, por meio da modalidade Compra Institucional do Programa de Aquisição de Alimentos- PAA, para aquisição de cestas agroecológicas e distribuição para discentes em situação de insegurança alimentar e nutricional.
A pandemia agravou o contexto de insegurança alimentar e nutricional da população urbana e rural, demandando a viabilização ao acesso a alimentos. Distribuir cestas agroecológicas é fundamental para promover saúde e dignidade, uma vez que a situação de escassez tem fomentado o consumo de produtos ultraprocessados e desconectados da cultura, do território. Dessa forma, a Campanha Alimentando a Vida foi uma experiência inovadora por utilizar o Guia Alimentar da População Brasileira e a Agroecologia como referências para pensar estratégias de distribuição de alimentos no contexto regional, ressignificando o “imaginário” (dentro e fora da instituição) sobre distribuição de cestas básicas para populações em situação de insegurança alimentar, principalmente no que se refere aos tipos de alimentos que geralmente compõem as cestas que comumente são distribuídas (alimentos não perecíveis- industrializados, principalmente carboidratos- e ricos em açúcares e gorduras) e origem, valorizando a produção local e os grupos sociais por ela responsáveis. Ao priorizar a aquisição e a distribuição de alimentos in natura e alguns considerados minimamente processados (como os derivados da mandioca), a Campanha Alimentando a Vida fomentou a articulação entre instituições e entidades de atuação regional, aproximando pessoas e instituições em torno das temáticas alimentação saudável e Agricultura Familiar, possibilitando a organização de um ecossistema de inovação por meio do qual foram gerados processos de organização social em prol da comercialização da produção familiar e da construção de conhecimento científico sobre diversas dimensões relacionadas à produção agrícola e ao abastecimento alimentar.
Em relação à comercialização da produção familiar, com a suspensão das feiras e da aquisição de alimentos para a alimentação escolar, muitas famílias vinham perdendo a produção. Observamos que a segurança de ter para quem vender é uma demanda das famílias agricultoras parceiras da campanha, assim como ampliar os canais de comercialização. Além disso, ressaltamos que a campanha é fruto do trabalho coletivo, em rede. Assim, ações coletivas são ao mesmo tempo desafio e solução para mudanças no abastecimento alimentar.
A demanda por alimentos continua e continuará no cenário pós- pandemia (que não sabemos quando será), assim como as dificuldades para comercialização da produção agroextrativista (principalmente para grupos que comercializavam seus produtos em feiras que estão suspensas). Entretanto, o encerramento da campanha não encerra a necessidade de realização de outras atividades por parte da comunidade acadêmica do IBEF. O abastecimento alimentar regional demanda reflexões acadêmicas sobre sistemas agroalimentares e perpassa pela discussão sobre modelos de produção agrícola, com foco na produção de conhecimento e fomento a sistemas de produção sustentáveis, agroecológicos. Qual o papel das universidades- e de outras instituições públicas e privadas- nesse processo?
Assim, considerando que o atual contexto está demandando políticas públicas, ações coletivas e inovações referentes ao abastecimento alimentar nas áreas urbanas e rurais, tanto para garantir o Direito Humano à Alimentação Adequada- DHAA no campo, rios, florestas e na cidade, quanto para evitar a perda de produção agrícola e aumento da pobreza, a partir da experiência que vivenciamos, abaixo sugerimos aos gestores públicos e à sociedade civil algumas medidas/ações para viabilizar o abastecimento alimentar saudável e territorializado, bem como para o fortalecimento da produção familiar e da economia diante dos impactos da pandemia.
Aos Gestores Públicos:
a) Fortalecimento das compras públicas de alimentos:
– Considerando as diretrizes do Programa de Nacional de Alimentação Escolar- PNAE, sugerimos que o Governo do Estado implemente estratégias que viabilizem a aquisição de alimentos da Agricultura Familiar e que as Prefeituras Municipais ampliem o número de gêneros alimentícios oriundo da produção familiar inclusos nas cestas de alimentos que estão sendo distribuídas aos alunos da rede pública de ensino. É fundamental descentralizar as aquisições de alimentos e organizar a logística de distribuição a partir das comunidades rurais. Sugerimos ainda a flexibilização do processo de aquisição dos alimentos da Agricultura Familiar a partir da negociação com os grupos/organizações contemplados na última chamada pública realizada, bem como com representações da categoria e a publicação de chamadas públicas emergenciais para ampliar o número alimentos da produção familiar e de agricultores familiares beneficiados;
– Considerando as diretrizes do Programa de Aquisição de Alimentos- PAA e o impacto positivo do programa em nível regional tanto do ponto de vista econômico quanto da melhoria da qualidade da alimentação das famílias beneficiadas, sugerimos alocação de recursos públicos estadual e municipais para o PAA de modo que as cestas básicas distribuídas para famílias situação de vulnerabilidade alimentar, bem como outras compras de alimentos realizada por órgãos públicos, privilegiem a produção familiar. Além de melhorar a qualidade da alimentação, garantir a inserção de gêneros alimentícios da Agricultura Familiar nas cestas básicas e nas refeições fornecidas em restaurantes/refeitórios custeados com recursos públicos é uma importante estratégia para fortalecer a economia local.
b) Investimento no apoio técnico aos grupos sociais que constituem as categorias Agricultura Familiar e Povos e Populações Tradicionais.
– Considerando as diretrizes da Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural- PNATER e da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, recomendamos alocação de recursos públicos federal, estadual e municipais no serviço público de extensão rural de modo a viabilizar apoio técnico à Agricultura Familiar em relação aos sistemas produtivos e à comercialização. Faz-se fundamental estruturar a PNATER, as Emater’s e as secretarias estadual e municipais de agricultura, bem como retomar as chamadas públicas para contratação de prestadoras de serviços para prestação de assessoria aos assentados da reforma agrária e aos povos e comunidades tradicionais;
– Considerando a importância dos Conselhos Estaduais e Municipais de Segurança Alimentar e Nutricional, de Saúde, de Alimentação Escolar e de Desenvolvimento Rural, bem como das Comissões Temáticas da Produção Orgânica como meios de participação social na discussão sobre alimentação saudável e sobre produção de alimentos, sugerimos o investimento governamental em programas estaduais e municipais de promoção de SAN de modo que sejam viabilizadas atuações dos conselhos e das comissões no fomento à produção orgânica e ao abastecimento alimentar saudável;
– Considerando a situação deficitária de transporte público nas comunidades rurais, a necessidade de isolamento social e que a maioria das famílias rurais não possuem veículo próprio, faz-se necessário apoio técnico e logístico imediato à Agricultura Familiar em relação à infraestrutura para transporte, armazenamento e distribuição dos alimentos da produção familiar. O atual contexto ressalta a demanda por investimentos governamentais, por meio de suas instâncias administrativas, para viabilização da comercialização da produção familiar destinada ao abastecimento alimentar nos municípios. Assim, recomendamos investimento público na infraestrutura e no quadro de recursos humanos das secretarias municipais e estaduais de agricultura (e instâncias administrativas afins) para que seja possível ampliar o apoio técnico e logístico, principalmente transporte e internet, destinado à organização da comercialização agrícola;
– Considerando a dinâmica de circulação intermunicipal de produtos agrícolas, é necessário que gestores públicos municipais dialoguem e pactuem ações conjuntas e em parceria com as representações da Agricultura Familiar e demais agentes pertinentes com vistas a organizar o fluxo de alimentos e a circulação de pessoas para fins de viabilizar em longo prazo o abastecimento alimentar saudável desde a produção até a distribuição dos alimentos;
– Considerando a necessidade de apoio ao setor produtivo primário, recomendamos implementação de estratégias de combate às perdas de produção agrícola e de fortalecimento de estoque de alimentos. Faz-se necessário implementar programas de apoio ao beneficiamento, armazenamento e distribuição de produtos de origem animal e vegetal com investimento em infraestrutura e logística (como espaço físico, veículos e recipientes adequados para transporte, embalagens, câmaras frias);
– A situação da pandemia ampliou a situação de vulnerabilidade alimentar das populações rurais e urbanas, ressaltando a importância da produção local de alimentos como estratégia de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional tanto no rural quanto no urbano. Além de destacar a importância da agricultura urbana e dos quintais agroflorestais para a alimentação das famílias residentes nas cidades e para os cuidados com a saúde, a demanda por alimentos em comunidades rurais e aldeias ressaltou a importância da produção para autoconsumo na redução da insegurança alimentar e nutricional das populações. Assim, sugerimos que os gestores públicos, assim como lideranças da agricultura familiar, invistam em estratégias de incentivo à produção de alimentos e plantas medicinais para o consumo familiar tanto no rural quanto no urbano.
– Investimento em pesquisa para geração de conhecimento sistematizado sobre a situação de insegurança alimentar e nutricional e do abastecimento alimentar regional, bem como sobre a produção local e sobre a promoção do Direito Humano a Alimentação Adequada.
– Investimento em ações de extensão universitária que potencializem a produção de alimentos saudáveis e a conexão entre universidade e sociedade.
c) Investimento em ações de prevenção contra o coronavírus com foco nas populações rurais
– Implementar protocolos de prevenção para funcionamento de feiras e mercados municipais de modo a orientar as coordenações e/ou associações gestoras desses espaços, feirantes e consumidores sobre como organizar o espaço e circular no mesmo durante o funcionamento da feira. Ressaltamos a importância da sanitização e alteração no layout dos espaços das feiras, além de medidas que reduzam a aglomeração de pessoas, tais como revezamento de feirantes e ampliação de dias de funcionamento das feiras;
– Instalação de lavatórios com disponibilidade de água corrente e produtos de higiene (sabão) nos mercados públicos, feiras e locais de desembarque de produção agrícola/extrativista (portos e centrais de abastecimento);
– Considerando o risco ao qual também estão sujeitas as populações do campo, das águas e das florestas, bem como a ampliação do número de casos de COVID- 19 em comunidades rurais e aldeias indígenas, sugerimos que sejam fortalecidas as ações de atenção primária à saúde nas áreas rurais (comunidades e aldeias). Sugerimos que, entre outras medidas, seja dado ênfase às seguintes: a) investimento na contratação de profissionais de saúde e em capacitação dos agentes comunitários de saúde, estruturação das unidades básicas de saúde situadas no rural, bem como na veiculação de informações acerca da prevenção contra o coronavírus; b) distribuição de máscaras e materiais de limpeza/higienização; c) orientações e fiscalização das condições de saúde e segurança dos trabalhadores rurais em empreendimentos agropecuários; d) apoio às comunidades na implantação de protocolos para circulação de pessoas entre comunidades, entre comunidade e cidade e intra comunidade.
À sociedade em geral
– Considerando que o consumo de alimentos ultraprocessados coloca em risco a saúde, recomendamos ampliação do consumo de produtos locais in natura e minimamente processados, produzidos e comercializados por agricultores familiares e por povos e populações tradicionais, principalmente do território;
– Considerando as inúmeras iniciativas solidárias de arrecadação e distribuição de alimentos, sugerimos que os alimentos produzidos pela Agricultura Familiar e por Povos e Populações Tradicionais sejam priorizados na composição das cestas que estão sendo distribuídas. É possível incrementar a alimentação fornecida com produtos locais, da produção familiar, melhorando sua qualidade do ponto de vista nutricional, além de aquecer a economia local e de valorizar os hábitos alimentares relacionados à identidade amazônida. Em caso da aquisição de produtos industrializados oriundos de outras regiões, recomendamos que a compra dos mesmos seja feita de microempreendedores e de trabalhadores informais, como estratégia para fortalecer pequenos negócios;
– No mesmo sentido da recomendação acima, sugerimos que editais publicados por instituições públicas, privadas e filantrópicas para custeio de distribuição de alimentos (cestas básicas) priorizem compras de alimentos regionais in natura e minimamente processados, conforme diretrizes da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional-PNSAN e o recomendado no Guia Alimentar Brasileiro;
– Considerando as perdas de produção agrícola, em especial de frutas e de hortaliças, e a importância do apoio ao setor produtivo local, sugerimos o estreitamento do diálogo entre empresários do setor de alimentação fora lar (restaurantes, lanchonetes, padarias, dentre outros) e associações, cooperativas e outras formas de organizações da agricultura familiar e de povos e populações tradicionais, de modo a ampliar os canais de comercialização da produção local por meio de estabelecimentos comerciais que vendem comida pronta para o consumo;
– Considerando a necessidade de desconcentração de renda para fortalecer a economia, sugerimos que compras de produtos industrializados sejam feitas em mercadinhos de bairros e preferencialmente produzidos localmente. Essa opção além de ampliar a circulação de dinheiro na cidade, descentralizando a concentração de renda e democratizando o acesso da população a recursos financeiros, contribuirá para a redução da situação da condição de vulnerabilidade social de muitas famílias. Da mesma forma sugerimos a priorização de compra de máscaras de costureiras em vulnerabilidade social.
A pandemia da COVID-19 está gerando diversos impactos sociais e econômicos em todo o planeta, em especial sobre as populações em situação de vulnerabilidade social tanto na cidade quanto nas áreas rurais. Cabe ao Estado, em seus diferentes níveis administrativos e esferas de poderes, implementar políticas municipais e estaduais de abastecimento alimentar com vistas a promover Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional. Desconcentrar renda, garantir o Direito Humano ao Direito a Alimentação Adequada- DHDAA e fomentar alimentação saudável e territorializada são ações fundamentais para o combate à fome, de incentivo à produção agrícola para abastecimento interno e de aquecimento da economia local.
Consideramos que medidas como as sugeridas acima, bem como outras com o mesmo escopo, terão importante impacto no território e fomentarão processos de Desenvolvimento Rural.