O PÃO NO 3 o ANO: a culinária na escola waldorf como prática de EAN
A prática culinária no 3 o ano da Escola Waldorf Moara é um recorte da importante expressão do alimento
na Pedagogia Waldorf e, apresentada aqui, como uma ferramenta para a Educação Alimentar e
Nutricional (EAN) possível de ser adotada em diversas comunidades escolares, sejam elas associativas,
públicas ou privadas. Nossa experiência tem sido aplicada em um cenário de escola associativa
(Associação Antroposófica Moara), onde a participação das famílias e a atuação voluntária tornam-se tão
importantes quanto a vivência das crianças e jovens e a atuação dos gestores, professores e colaboradores
inseridos no quadro.
No ano de 2022, com a retomada das aulas presenciais no “pós-pandemia”, a prática culinária no
ambiente escolar tem alcançado de forma visível, grande importância para sociabilização e outros
aspectos que envolvem nossa relação com o alimento. Ao lançarmos um olhar para os 10 anos do Marco
de Referência para a Educação Alimentar e Nutricional, resgatamos também a essência do convívio
natural e saudável das crianças com a alimentação em seu dia a dia. E, no exercício de autoconhecimento,
compaixão, e resiliência, o “fazer o pão” tem fermentado a autonomia das crianças e jovens, assim como
o engajamento de toda a comunidade por uma alimentação mais consciente e sustentável.
ENGAJAMENTO COMUNITÁRIO E TRABALHO VOLUNTÁRIO
Integrante da associação escolar e engajada na reestruturação da Cozinha Pedagógica, fui convidada pela
professora de classe do 3 o ano, Simone do Prado, a orientar as vivências culinárias, já previstas no
planejamento pedagógico das crianças entre 8 e 10 anos de idade. Para esta imersão, traria a leitura
sensível e a dinâmica de trabalho da Cozinha do MiniChef: escola de gastronomia infantil que criei em
2012 – ano que remota ao próprio Marco Referencial de EAN. Assim, também com o intuito de celebrar
os 10 anos de nossa trajetória voltada à familiarização das crianças e jovens com o ambiente lúdico da
cozinha e a boa relação com o alimento, aceitamos o convite para a atuação voluntária que, hoje, guia
nosso relato de experiência, com o intuito de motivar parcerias semelhantes nos diversos cenários
comunitários.
No cenário pedagógico em que nos inserimos, torna-se importante explicitar o valor simbólico da
produção artesanal do pão em sala de aula pois, na Pedagogia Waldorf, a essência da feitura do pão é algo
que acompanha as crianças desde o jardim, com o propósito de fortalecer os laços de toda a comunidade.
Como “atores externos” convidados a iniciar um processo de ensino, aprendizagem e troca de
experiências, salientamos o lado crucial de estudar a dinâmica da pedagogia em que iremos nos inserir,
para que haja o reconhecimento e a fluidez das práticas, tanto quanto a implementação de possíveis
adaptações.
Na Pedagogia Waldorf, habitualmente, histórias, receitas, atividades e brincadeiras são propositalmente
repetidas por um período relativamente longo a cada época (período dedicado a uma disciplina/
atividade). Esta foi nossa primeira interferência proposital, na abordagem que seria tradicionalmente
aplicada no contexto
da pedagogia. Paradoxalmente, nossa proposta pela não repetição da mesma receita/atividade, seria
fundamentada com o propósito de aguçar a atenção plena e despertar curiosidades, com respeito
ao ritmo dinâmico natural da idade. Assim, procuramos nos desviar do automatismo – hábitos
automáticos que também impedem observação crítica sobre o consumo. Trabalhamos então a partir de
uma receita básica, aumentando a complexidade e inserindo novos ingredientes a cada encontro. Desta
forma, também conseguimos aguçar a observação crítica sobre cada etapa do processo, assim como sobre
as informações e insumos apresentados.
Partimos ao relato das etapas, até então alcançadas, em uma linha do tempo evolutiva que destaca nosso
trabalho em DIÁLOGOS ESTRATÉGICOS; EAN em PRÁTICAS CULINÁRIAS (registradas no livro
de receita anexado à experiência) e recortes pontuais sobre o ENGAJAMENTO NAS AÇÕES
COLETIVAS para a Reestruturação da Cozinha Pedagógica.
As etapas da Panificação – descritas no recorte “EAN em PRÁTICA CULINÁRIA”- obedecendo a ordem
em que foram trabalhadas em sala de aula, estão dispostas em um livro de receitas (anexado), ainda em
construção. O livro, em formato de e-book, será lançado à comunidade escolar no final do ano letivo,
ocasião em que pretendemos divulgá-lo também para as demais escolas waldorf do Brasil – sejam elas da
rede pública, associativas ou privadas -, com o intuito motivador da aplicação da prática culinária como
ferramenta de EAN e desenvolvimento psicosocial de crianças e jovens no ambiente escolar.
Por fim, entendemos que a aliança entre educação, saúde, desenvolvimento social e consciência
sustentável, com respeito às vivências lúdicas das crianças e amadurecimento saudável dos jovens torna-
se um “modo de preparo” básico para obtermos uma sociedade física e mentalmente saudável. Com este
propósito, vimos que a prática culinária na promoção da Educação Alimentar e Nutricional, torna-se um
ingrediente fundamental.
LINHA DO TEMPO
FEVEREIRO/MARÇO
DIÁLOGOS com corpo pedagógico do ensino fundamental e médio da Escola Waldorf Moara para o
resgate da Cozinha Pedagógica e condução das aulas de culinária do 3º ano. Começamos a utilizar a
estratégia de sandbox para observação e estabelecimento de um possível modelo a ser adotado
posteriormente nas demais turmas.
Agenda com a professora de classe do 3º ano sobre a rotina e dinâmica das vivências culinárias
Acompanhamento da primeira vivência da turma, para o plantio de milho, trigo e feijão (previsto
no planejamento curricular waldorf )
Periodicidade e carga horária Estabelecida: encontros às terças feiras no horário de 8 às 10h com
a turma para as vivências culinárias e 10 às 12h para finalização da produção e observação
técnica sobre a utilização do espaço físico da Cozinha Pedagógica.
EAN em PRÁTICA CULINÁRIA: Em nosso primeiro momento de culinária em sala de aula, cada
criança produziu uma massa de chapati – com farinha integral, água e sal. Sem a necessidade de
fermentação, os pães foram assados numa chapa e consumidos pelas próprias crianças no momento do
lanche. A imersão no momento de produção da massa e a observação sobre os efeitos de temperatura para
a sua finalização garantiram o envolvimento consciente e a atenção plena de cada criança de forma ímpar
no processo. Produções da 1ª etapa: Chapati (para lanche individual); Pão Integral básico com farelo de
trigo (compartilhado com família); Pão com cacau e aveia (presenteado a alunos de outra turma)
ENGAJAMENTO E AÇÕES COLETIVAS para a reestruturação da Cozinha Pedagógica: Realizamos o
primeiro estudo do espaço físico comumente utilizado pelas demais turmas da escola. Abrimos o diálogo
com as professoras responsáveis sobre necessidades e prioridades apontadas e fizemos registros
fotográficos do cenário
ABRIL/MAIO
DIÁLOGOS com a professora de classe do 3º ano sobre animosidade, espírito colaborativo da turma e
inclusão dos pares. Grafismo a partir da memória sobre ingredientes utilzados, modo de preparo e
percepção do produto final
EAN em PRÁTICA CULINÁRIA: mudança no tempo de fermentação da massa, sova e dobras – adotada
técnica de manuseio lento e atento
Crianças colhem flores comestíveis e ervas para variação das receitas;
Variações da receita a partir da base escolhida para elaboração dos pães
Produção da 2ª etapa: Pães Integrais com variação de sementes de abóbora, sementes de girassol,
fubá, farelo de trigo, aveia, flores e ervas (Compartilhado com a família e Parte da Produção
doada à comunidade escolar)
ENGAJAMENTO E AÇÕES COLETIVAS para a reestruturação da Cozinha Pedagógica: Levantamento
de utensílios e equipamentos necessários para reequipar a Cozinha; criação de um grupo de whatsapp
com professores e familiares interessados no Projeto;
JUNHO/JULHO
DIÁLOGOS com a professora de classe do 3º ano sobre atender a demandas das crianças por outras
receitas. Observação sobre animosidade da turma e aplicação de Questionário ( modelo Google forms)
para avaliação das famílias a respeito das atividades de EAN realizadas a partir da culinária no 3º ano.
Análise dos dados obtidos na Pesquisa.
EAN em PRÁTICA CULINÁRIA: Variações da receita com destaque para cores e sabores: Abóbora,
Beterraba, Brócolis, espinafre, cúrcuma, páprica e ervas frescas colhidas na horta da escola
Crianças visitam feira orgânica em frente à escola: proposta para variar receitas, despertar
curiosidade e interesse;
Produção de Foccaccia e Pão de abóbora com cúrcuma e alecrim (para lanche coletivo);
Pão de Beterraba com flores de Ipê;
Pão de brócolis com espinafre e manjericão (para compartilharem com a família);
Exercício da Atenção Plena durante o processo de produção e o consumo: mudança na coloração
conforme ingredientes e modo de preparo; observação sobre fermentação e modelagem dos pães
ENGAJAMENTO E AÇÕES COLETIVAS para a reestruturação da Cozinha Pedagógica: Diálogo com
professores e corpo administrativo da escola sobre próximas ações para engajamento da comunidade
escolar no Projeto da Cozinha Pedagógica.
AGOSTO/SETEMBRO
DIÁLOGOS com a professora de classe do 3º ano sobre envolver as crianças na produção de novas
receitas com propósito de pequena arrecadação financeira em prol de passeio pedagógico e trabalho na
matemática prática. Diálogo com a professora de classe e a professora de jardinagem sobre a edição do e-
book com todas as receitas trabalhadas ao longo do ano
EAN em PRÁTICA CULINÁRIA Diversificação das receitas: grissinis e biscoitos. Mudança no tipo de
preparo:Crianças produzem, e contabilizam valor mínimo de venda, com lucro em prol de passeio
pedagógico. Organização das famílias para venda de café da manhã na frente da escola, com participação
simbólica das crianças na produção de Grissinis.
Produção de Grissinis de queijo e cúrcuma e Grissinis de Gergelim
Grissinis de Orégano com páprica doce e Grissinis de canela
Pão Azul: colheita de jenipapo na praça em frente à escola, para o experimento surpreendente
(receita disponível no e-book)
Pão de Dragão: Para comemorar a semana festiva de gincanas, o 3º recebeu o desafio de
produzir um pão em formato de dragão (o Dragão de Micael). Para montar o pão em tamanho
“gigante”a turma foi dividida e cada grupo ficou responsável por uma parte da produção: cabeça,
partes do corpo, asas, patas… Como base, usamos as receitas do pão de abóbora com alecrim e
do pão azul de jenipapo. A produção foi compartilhada com as demais turmas do ensino
fundamental.
ENGAJAMENTO E AÇÕES COLETIVAS para a reestruturação da Cozinha Pedagógica: criação de um
e-mail institucional cozinhapedagogica@escolawaldorfmoara.com.br e chave pix para arrecadação
financeira voltada à compra de utensílios, equipamentos e reestruturação física da Cozinha Pedagógica
Coletiva.