Pela natureza do GTO não ser de caráter assistencial e abranger todo o município em questão. Faremos uma breve caracterização do município a seguir: Vitória de Santo Antão é um município localizado na Zona da Mata Centro do estado de Pernambuco, a aproximadamente 45 KM da capital Recife com aproximadamente 144 mil habitantes, se configurando como município de médio porte. Com uma área territorial de 336,573 km², o município é classificado pelo IBGE como urbano, mas apresenta amplas zonas rurais, incluindo algumas áreas remotas. A organização da rede de saúde do município está dividida em quatro territórios sanitários (1, 2, 3 e rural), que abrangem tanto as regiões urbanas quanto rurais.
No que se refere à rede de atenção à saúde, Vitória de Santo Antão possui uma cobertura significativa na Atenção Primária à Saúde (APS). Atualmente, cerca de 85% da população — o equivalente a 125 mil pessoas — está cadastrada no sistema e-SUS APS. A cobertura assistencial tem sido ampliada através da reorganização territorial das equipes de Saúde da Família (eSF) e da abertura de novas equipes. A APS do município conta com 52 equipes no total, sendo 48 de Saúde da Família e 4 equipes de Atenção Primária. Destas, 14 equipes atuam em áreas rurais e 12 operam com horário estendido por meio do Programa “Saúde Até Mais Tarde”. Há ainda 40 equipes de Saúde Bucal e 6 equipes multiprofissionais (eMulti).
Já média complexidade conta com diversos serviços especializados, como a Unidade de Pronto Atendimento Especializada (UPAE), Policlínica da Criança e do Adolescente, Núcleo de Apoio à Saúde Mental (NASM), Clínica da Mulher (CESMU), Centro Oftalmológico da Vitória (COV), dois Centros de Especialidades Odontológicas, Centro de Testagem e Acolhimento (CTA), Centro Multidisciplinar Infantil (CEAMI), Laboratório Central Municipal da Vitória (LACEV), Clínica de Reabilitação (CRER), SAMU, Central de Marcação (CEMAIC) e ambulatório LGBTQIAPN+. Além disso, o município mantém convênios com seis laboratórios para exames e outras clínicas de imagem.
O GTO atende demandas oriundas de investigações e discussões de óbitos maternos, infantis e fetais.
Entre os principais desafios enfrentados estavam a baixa sensibilidade inicial de alguns profissionais da APS e da AE frente à análise dos óbitos, a dificuldade de manter a regularidade das reuniões diante da alta demanda acumulada, e a resistência de setores hospitalares à abordagem crítica e integrada. Também se identificaram fragilidades nos registros clínicos, o que exigiu esforços de qualificação documental e formativa das equipes. Sobre a regularidade das reuniões, mesmo realizando reuniões mensais, há uma percepção de que deveríamos ter mais momentos e mais espaços de discussões.
Na perspectiva de aprimorar a sensibilidade e o engajamento dos profissionais da Atenção Primária à Saúde (APS) e da Atenção Especializada (AE) para a análise crítica de óbitos. Superando a baixa adesão e descontinuidade observadas em experiências anteriores, o GTO investiu no fortalecimento de uma cultura de escuta ativa e corresponsabilização, onde cada caso de óbito é compreendido como uma oportunidade de aprendizado coletivo e aprimoramento contínuo da assistência. A presença e o comprometimento dos profissionais do Programa Mais Médicos foram estratégicos para essa mudança, impulsionando a participação qualificada e o reconhecimento da relevância das discussões do grupo
Apesar da regularidade das reuniões mensais do GTO, a percepção da equipe e dos gestores aponta para a necessidade de mais espaços e momentos de discussão. Essa perspectiva reflete a riqueza dos casos analisados e das intervenções propostas, indicando que a otimização da frequência e/ou duração das reuniões, ou a criação de fóruns complementares, poderia aprofundar as análises e acelerar a pactuação e implementação de novas ações. Buscamos continuamente refinar a metodologia de nossas reuniões para garantir que todos os temas relevantes sejam abordados com a profundidade necessária e que as recomendações sejam formuladas de maneira mais assertiva.
A integração plena da rede de atenção foi um dos maiores desafios, especialmente em relação à resistência de setores hospitalares a uma abordagem crítica e integrada. O GTO tem atuado ativamente para superar essa barreira, promovendo um diálogo construtivo e demonstrando como a análise colaborativa de óbitos não visa a culpabilização, mas sim a identificação de fragilidades sistêmicas e a reorganização de fluxos assistenciais em benefício de todo o sistema de saúde. Através da apresentação de dados concretos e da pactuação de ações que resultam em melhoria da qualidade assistencial, buscamos fortalecer a corresponsabilização e aprimorar a articulação intersetorial interna do SUS, essencial para a integralidade do cuidado.
Relatar a experiência do GTO cujo objetivo é qualificar a rede de atenção a partir da análise detalhada de óbitos maternos, infantis e fetais, promovendo ações educativas e reorganizando fluxos assistenciais com base em evidências e práticas compartilhadas. Além disso, busca-se desenvolver uma cultura de escuta e corresponsabilização, reforçando o papel da gestão participativa e do cuidado humanizado.
O Programa Mais Médicos (PMM) foi criado com o objetivo de ampliar o acesso à atenção básica de saúde em regiões com escassez de profissionais, promovendo a fixação de médicos no território e o fortalecimento da Atenção Primária à Saúde (APS). Em Vitória de Santo Antão (PE), desde 2018, o Grupo Técnico de Discussão de Óbitos (GTO) passou a contar com a participação de médicos vinculados ao PMM, o que representou um marco na consolidação dessa estratégia. Antes disso, as tentativas de implementação do GTO com médicos contratados da rede municipal ou especialistas enfrentavam baixa adesão e descontinuidade.
A chegada de um médico de formação cubana do PMM em 2018, sensibilizado com a causa e com forte compreensão do papel da APS como coordenadora do cuidado, foi decisiva para estruturar técnica e politicamente o GTO, conferindo-lhe regularidade, profundidade nas análises e compromisso com os fluxos assistenciais. Desde então, até os tempos atuais (2025) mesmo com a saída do médico referido acima, tem-se buscado priorizar profissionais do PMM para compor o GTO, dada a maior possibilidade de permanência no território e o alinhamento com os princípios da APS e do SUS.
Apesar do sucesso impulsionado pela participação dos médicos do Programa Mais Médicos, reconhecemos a importância de diversificar e fortalecer continuamente a base profissional do GTO para garantir sua sustentabilidade a longo prazo. Estamos sempre buscando fomentar a participação de outros profissionais médicos da rede municipal.
Mais do que uma estrutura de resposta técnica a eventos sentinela, o GTO tornou-se um verdadeiro dispositivo de qualificação da gestão, da assistência e da humanização na atenção à saúde em Vitória de Santo Antão. A prática reafirma a potência da APS como ordenadora e coordenadora do cuidado, evidencia a importância do trabalho em equipe com médicos do PMM e fortalece a cultura do cuidado ético, integral e centrado na vida. Por sua articulação, impacto e possibilidade de replicação, essa experiência representa uma contribuição valiosa para a consolidação de práticas inovadoras no SUS.
Para além das discussões internas, a disseminação ampla dos achados, das recomendações e das ações implementadas pelo GTO é valorizada na perspectiva de fortalecer a cultura de aprendizado e aprimoramento em toda a rede de saúde. A publicação de relatórios anuais, a apresentação de resultados em fóruns e colegiados municipais e estaduais, e o compartilhamento de boas práticas através de canais institucionais, como o Laboratório de Inovação do PMM, são estratégias que visam dar visibilidade ao trabalho do GTO e também inspirar outros municípios na construção de dispositivos semelhantes, ampliando o impacto positivo na redução de óbitos evitáveis.
Algumas informações adicionais sobre resultados e indicadores estão nos anexos dessa publicação.
A partir das análises, foram definidos novos fluxos na assistência ao pré-natal como a descentralização dos testes rápidos de sífilis, HIV e hepatites, assim como um fluxo prioritário para realização de exames laboratoriais nas gestantes, viabilizando a entrega oportuna dos exames do pré-natal na APS e na Atenção Especializada.
A partir das discussões sistematizadas no âmbito do GTO, identificou-se também a necessidade de qualificar ainda mais o pré-natal ofertado na rede municipal, especialmente frente a ausência de contratualização de determinados exames, preconizados para assistência ao pré-natal, pelo Ministério da Saúde, comprometendo a detecção oportuna de riscos gestacionais, diagnóstico e tratamento adequados. Como resposta concreta a essa reflexão coletiva, foram inseridos no rol de exames de pré-natal contratualizados, mais três exames complementares, (TOTG, Coombs indireto e Urocultura), ampliando a oferta disponível para as gestantes acompanhadas na Atenção Primária à Saúde. Já na média complexidade, a fim de garantir uma melhor assistência às gestantes acompanhadas no pré-natal de alto risco, por diabetes gestacional, foram adquiridos glicosímetros para a Clínica da Mulher (CESMU) visando um adequado monitoramento e acompanhamento destas gestantes. Essas medidas, pactuadas entre a gestão e os serviços conveniados, representou um avanço na integralidade do cuidado e reflete a capacidade do nosso GTO de gerar impactos reais e estruturantes a partir da análise crítica dos óbitos evitáveis.
A baixa qualidade dos registros clínicos emergiu também como um ponto crítico, exigindo esforços substanciais em qualificação documental e formativa das equipes. Reconhecemos que a fidedignidade e completude das informações nos prontuários são pilares para uma análise de óbitos eficaz e para a identificação precisa das causas e pontos de intervenção. Por isso, foram implementadas ações contínuas de capacitação e sensibilização sobre a importância da documentação detalhada, na compreensão de que cada registro é uma ferramenta vital para a segurança do paciente e para a qualificação da gestão e da assistência. Nesta perspectiva, os médicos dos programas mais médicos atuaram como o facilitador, da categoria médica, em alguns momentos de capacitação da rede, viabilizando uma maior adesão e comprometimento dos profissionais da APS, fortalecendo assim o acompanhamento de gestantes de risco habitual e encaminhamentos oportunos nas gestações de risco intermediário e alto risco.
Essa atuação do GTO foi reconhecida regionalmente pela Gerência Regional de Saúde (GERES), destacando-se pela qualidade técnica e cumprimento dos prazos nas notificações e investigações, sendo apresentada como experiência exitosa na EXPI-VIGAS- Mostra de Experiências Integradas de Vigilância e Atenção à Saúde promovida pela GERES I.