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Situação de Saúde da população de Porto Alegre

Com 1.481.019 habitantes (estimativa IBGE, 2016), ritmo lento de crescimento populacional, com população predominantemente adulta, economicamente ativa e Índice de Desenvolvimento Humano Municipal considerado alto (0,805 – 7ª melhor capital do Brasil), a população de Porto Alegre apresenta hábitos e estilo de vida que interferem nos resultados em saúde. Destaca-se que é a capital com maior taxa de tabagismo entre adultos, com alto consumo de açúcar e de sal e com pouca prática de atividade física, se comparada com as demais capitais brasileiras (VIGITEL 2015). Dessa forma, apresenta composição demográfica e hábitos que se traduzem em altas taxas de doenças crônicas não transmissíveis.

Dos dados e indicadores gerais relacionados à saúde, o Coeficiente de Mortalidade Geral da cidade é 8,15 óbitos para cada 1.000 habitantes, sendo os óbitos por doença do aparelho circulatório a primeira causa, seguidos pelas neoplasias e causas externas. A Mortalidade Infantil (9,19 para cada 1.000 nascidos vivos em 2015), apesar de não apresentar desigualdade acentuada entre brancos e negros, apresenta desigualdades territoriais importantes, que variam entre 2,64 (Sul) e 22,56 (Ilhas). Quanto aos agravos transmissíveis e não transmissíveis, o próximo quadriênio exigirá esforços para a melhoria dos indicadores relacionados aos agravos não transmissíveis, como neoplasias, doenças cardiovasculares e respiratórias, transtornos mentais e causas externas; e para o contínuo enfrentamento da tuberculose, HIV, sífilis e doenças de transmissão vetorial.

Porto Alegre apresenta alta endemicidade de Tuberculose, com 1.315 casos novos de todas as formas clínicas no ano de 2016. É a segunda capital em incidência (87 casos/100.000 habitantes) de tuberculose, mesmo com a queda na incidência em 2016 em relação aos anos anteriores. Associada à alta incidência, a taxa de abandono do tratamento é de 28%, enquanto que a recomendação é de uma taxa de abandono de até 5%. Destaca-se que o abandono de tratamento é alto em praticamente todos os distritos sanitários (com exceção do Extremo Sul).

Apesar da tendência de queda nos indicadores de incidência e mortalidade por Aids, Porto Alegre ainda é a capital e cidade com a maior incidência de casos nos últimos 10 anos (95,20 casos por 100.000 habitantes – série histórica de 2005 a 2015, conforme o Ministério da Saúde) (BRASIL, 2016d) e tem o maior coeficiente de mortalidade nos últimos 5 anos. A análise anual mostra diminuição também da Transmissão Vertical do HIV, chegando, na coorte de crianças nascidas no ano de 2014, cujo encerramento da exposição ocorreu em 2016, a uma taxa de 3%, com 11 crianças infectadas.

Quanto às características das gestantes portadoras do HIV, a faixa etária preponderante é de 25 a 29 anos, com escolaridade de 4 a 7 anos de estudo. A análise de raça/cor/etnia revela uma taxa de transmissão vertical de 40% na população negra – o dobro da taxa registrada para a população geral de Porto Alegre, que, de acordo com o IBGE, é de 20%.

Como problema de saúde pública, a gravidade da Sífilis está relaciona à transmissão vertical, que em Porto Alegre apresentou taxa de 27,7 casos por

1.000 nascidos vivos no ano de 2016, enquanto que a meta nacional de eliminação da sífilis congênita conjunta com a transmissão Vertical do HIV preconiza uma taxa de 0,5 casos por 1.000 nascidos vivos.

Apesar do percentual de cobertura de gestantes com pré-natal (75,25% em 2016), problemas no seguimento do cuidado de gestantes são evidenciado quando comparado o número total de casos notificados de sífilis na gestação (386 casos no ano de 2016) e o número total de casos notificados de sífilis congênita no mesmo período (547 casos). Mesmo tendo aumentado o percentual de realização de tratamento para sífilis no pré-natal, o tratamento foi considerado inadequado em 78%, sendo 54% em virtude do não tratamento do parceiro. Considera-se que, apesar do grande número de casos (2.497 no ano de 2015), haja grande subnotificação do agravo.

Das Doenças Transmitidas por Vetores, tanto a leishmaniose, quanto a leptospirose estão associados a condições ambientais precárias de habitação. Embora anteriormente já houvesse registro de casos de cães sorologicamente positivos em alguns bairros, o primeiro caso de leishmaniose visceral humana em Porto Alegre ocorreu em setembro de 2016. O segundo caso de óbito foi em fevereiro de 2017. Na leptospirose, o sexo masculino tem sido o mais exposto aos fatores de risco e representa a maioria dos casos confirmados. De 2013 a 2016, ocorreram 128 casos do sexo masculinos e 32 casos do sexo feminino.

Das Doenças Imunopreveníveis, destaca-se a vigilância de surtos de caxumba, de coqueluche e de influenza, seja no âmbito da cobertura de imunobiológicos nos grupos de risco, seja nas notificações e ações de bloqueio epidemiológico. Quanto à coqueluche, por exemplo, a maior parte é de crianças abaixo de 1 ano e, dos casos hospitalizados em 2016 por coqueluche, a ampla maioria não possuía vacinação e tinha menos de 6 meses; algumas estavam abaixo de 2 meses (idade da primeira dose da vacina).

As Doenças Crônicas Não Transmissíveis estão entre as principais causas de morte em todas as regiões da cidade (doenças cardiovasculares, neoplasias, doenças do aparelho respiratório e causas externas). Cerca de 75% da morbidade e mortalidade são decorrentes das doenças crônicas não transmissíveis e, por isso, esse é o conjunto mais importante de morbidades a merecer atenção da SMS-POA nos próximos 4 anos.

De maneira geral, dentre os usuários que procuram assistência médica na atenção básica, entre 25% a 50% apresentam pelo menos um transtorno psiquiátrico ou neurológico. Contudo, a não detecção dos casos pode ser de 55% para diagnóstico de depressão e até 77% para transtorno de ansiedade generalizada (4), evidenciando um percentual elevado de pessoas sem a devida assistência para os transtornos mentais. Em Porto Alegre, da mesma forma que as doenças crônicas não transmissíveis, inexistem dados de vigilância de morbidade em Saúde Mental que possam auxiliar na direcionalidade da política pública nesta área. Os dados existentes referem-se às poucas notificações de tentativas de suicídio e às doenças em saúde mental do trabalhador, ambas de notificação compulsória, além de dados epidemiológicos da literatura.

As Causas Externas são a terceira principal causa de morte em Porto Alegre (10,47% do total de óbitos), acometendo 3,9 homens para cada mulher (4:1). Dentre as principais causas estão os homicídios (56,4%) principalmente contra homens jovens, seguidos das quedas (14,4%) principalmente de idosos e mulheres, dos acidentes de transporte (11,1%) principalmente contra idosos e motociclistas. De forma geral, observa-se uma maior concentração de eventos entre adolescentes, adultos jovens e adultos, sendo a maior proporção dos óbitos por causas externas na faixa etária entre os 20 e os 29 anos.

Frente ao quadro epidemiológico e de situação de vida da população porto- alegrense, a rede de serviços de saúde disponíveis na cidade precisa atuar dinamicamente para atender às principais necessidades e às demandas por serviços de saúde. Assistência, vigilância e gestão precisam alinhar-se a essas necessidades e demandas, da atenção primária à alta complexidade.

Na Atenção Primária à Saúde, apesar da cobertura populacional estimada pela Atenção Primária no município de 62,5%, apenas 48,2% da população está adequadamente coberta por equipes de Saúde da Família completas, apenas 29,5% da população está coberta por Agente Comunitário de Saúde (ACS) e apenas 38,4% tem cobertura de saúde bucal adequada. Na maioria destes serviços, há correlação inversa entre as coberturas populacionais estimadas pelas ESF, ACS, AB e SB e o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), indicando equidade na distribuição dos recursos públicos. A exceção está nos distritos Restinga e Lomba do Pinheiro, com IDHM baixos e coberturas intermediárias, apontado para a necessidade de ampliação da atenção primária nesses territórios. Ampliar acesso a Atenção Primária é desafio principal para os próximos quatro anos.

Outro ponto importante a ser trabalhado no quadriênio é a qualidade da oferta de serviços de atenção básica. Destacam-se a estrutura dos serviços, a ausência de uma carteira de serviços, a limitação de acesso pela ausência de acolhimento e de acesso por demanda espontânea, bem como pela violência em alguns territórios.

Problemas na qualidade da oferta destes serviços diminuem a sua efetividade e dispendem recursos públicos, uma vez que resultam em Internações por Condições Sensíveis à Atenção Primária. Em 2016, 29,9% de todas as internações clínicas de pessoas residentes em Porto Alegre foram causadas por agravos que poderiam ser controlados e tratados precocemente nos serviços de APS, como a asma, a bronquite, a hipertensão arterial e a infecção no rim e no trato urinário e a infecção da pele e do tecido subcutâneo.

Na oferta de serviços de Saúde Mental também é identificada a necessidade de ampliação da rede de serviços, seja no atendimento à saúde mental na Atenção Primária, seja nos Centros de Atenção Psicossocial e nas demais estratégias não hospitalares e eletivas. Apesar de contar com duas emergências em saúde mental, o número de Centros de Atenção Psicossocial (12) é inadequado para as necessidades e abrangência populacional de Porto Alegre. O uso abusivo de álcool e outras drogas, bem como o crescente número de crianças e adolescentes em sofrimento psíquico, aponta para a necessidade a ser suprida no próximo quadriênio quanto à ampliação dos serviços da Rede de Atenção Psicossocial que têm essa vocação assistencial.

Além desses serviços de Atenção Primária e de Saúde Mental, o conjunto de serviços especializados, de apoio diagnóstico, hospitalares e de vigilância em saúde disponível em Porto Alegre exige manutenção e revisão permanentes, visando a, no mínimo, manter a qualidade ofertada. Além disso, novas ofertas, baseadas nas mais recentes e efetivas tecnologias de informação e comunicação, como telessaúde e telemedicina devem ser priorizadas e implantadas, a fim de aumentar acesso, garantir escala e qualidade, e reduzir custos diretos e indiretos da prática assistencial. Deverá ser priorizada, dentro da vocação de cada componente, a contribuição para a efetivação das políticas de saúde (Saúde da Criança, do Adolescente, da Mulher, do Homem, do Idoso, do Indígena, da População Negra, da Saúde Prisional, Transmissíveis e Não Transmissíveis) e a relação com o desfecho (indicadores de saúde). Um exemplo é a alta taxa de abandono ao tratamento da tuberculose e o Centro de Referência a Tuberculose: qual a relação e como cada componente pode auxiliar na efetivação do cuidado em rede?

O uso eficiente do conjunto de serviços de saúde também depende de um Sistema de Regulação potente, que abranja todos os serviços disponíveis no SUS em Porto Alegre e não apenas o primeiro acesso aos serviços eletivos ou apenas os casos urgentes de internação hospitalar, mas também todo o espectro do itinerário terapêutico e os diversos passos de transição de cuidado. Este então é um grande desafio para o quadriênio: prover um sistema de regulação que  utilize tecnologias de comunicação e informação, protocolos assistenciais, que seja regionalizado, tenha como base de contratação a qualidade, escala e escopo, com contratos adequados às necessidades da população e que, com tudo isso, apoie o controle e a economia na aplicação dos recursos  assistenciais disponíveis, beneficiando o maior número possível de cidadãos.

Não serão poucos os desafios para a efetivação de serviços de qualidade, que consigam mudar a realidade epidemiológica vivida pelos porto-alegrenses. Dentro deste cenário, uma gestão baseada em resultados será norteadora das ações para o quadriênio 2018-2021. E assim estão apresentadas as 11  Diretrizes, 27 Objetivos e 58 Metas do Plano Municipal de Saúde 2018-2021 de Porto Alegre: direcionadas aos principais problemas de saúde da população e focadas em uma gestão que atue com planejamento estratégico, democrático, intersetorial e que valorize a atenção primária, a regulação clínica, a equidade, o uso de evidências e de tecnologias de informação e de comunicação como ferramentas e estratégias fundamentais de disseminação das melhores práticas em saúde pública.

Fonte – Plano Municipal de Saúde de Porto Alegre