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O arcabouço legal referente aos vínculos dos ACS e dos ACE com o Poder Público tem seu pressuposto inicial na Emenda Constitucional 51/2006, que institui a contratação direta desses profissionais pelo Estado e o processo seletivo público como forma de contratação. A Lei 11.350/ 2006, estabelece o regime jurídico e a regulamentação das atividades desses profissionais, enquanto a Lei 12.944/2014, estabelece piso salarial nacional para esses profissionais. Já o Decreto 8.474/ 2015, regulamenta a atuação dos ACS e ACE e estabelece assistência financeira complementar por parte da União.
Em termos de regimes jurídicos são aceitas duas modalidades: (a) Empregos Públicos: estados e municípios podem contratar diretamente esses profissionais sob o regime jurídico estabelecido pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, por meio de processo seletivo público de provas condizentes com os cargos de ACS e ACE, salvo se houver lei municipal que estabeleça a contratação em regime estatutário; (b) Cargos Públicos: Estados e municípios podem contratar diretamente esses profissionais em regime estatutário, se for estabelecido pela legislação local, precedido por processo seletivo público de provas condizentes com o cargo de ACS e ACE.
A lei prescreve também a natureza das atividades desses profissionais, incluindo os componentes de: utilização de instrumentos para diagnóstico demográfico e sócio-cultural da comunidade; promoção de ações de educação para a saúde individual e coletiva; registro, para fins exclusivos de controle e planejamento das ações de saúde, de nascimentos, óbitos, doenças e outros agravos à saúde; estímulo à participação da comunidade nas políticas públicas voltadas para a área da saúde; realização de visitas domiciliares periódicas para monitoramento de situações de risco à família; além da participação em ações que fortaleçam os elos entre o setor saúde e outras políticas que promovam a qualidade de vida.
No caso específico dos ACE, o Art. 4º da lei 11.350 define como atribuição dos mesmos as atividades de vigilância, prevenção e controle de doenças e promoção da saúde, desenvolvidas em conformidade com as diretrizes do SUS e sob supervisão do gestor de cada ente federado.Em um caso ou outro, cabe ao Ministério da Saúde disciplinar as atividades de ambas as categorias.
A Lei 11.350 detalha, ainda, os pré-requisitos para o exercício das atividades. No caso dos ACS, de acordo com o Art. 6º, estes devem preencher os requisitos de: residir na área da comunidade em que atuar, desde a data da publicação do edital do processo seletivo público, cabendo ao ente federativo responsável definir a área geográfica de atuação, seguindo parâmetros estabelecidos pelo Ministério da Saúde; conclusão, com aproveitamento, de curso introdutório de formação inicial e continuada, além do ensino fundamental. Para os ACE as exigências são semelhantes, com exceção da residência na área geográfica.
A Lei 12.994/2014 (Art. 9-A) estabelece o valor de R$ 1.014,00 como o piso salarial da categoria, abaixo do qual a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não poderão fixar o vencimento inicial, considerando uma jornada de trabalho de 40 horas semanais. Acima desse valor, os entes federados têm autonomia para fixar vencimentos. São estabelecidas, ainda, nesta
Lei as diretrizes para a criação de planos de carreira, que incluem a remuneração paritária dos ACS e dos ACE; a definição de metas dos serviços e das equipes; o estabelecimento de critérios de progressão e promoção; a adoção de modelos e instrumentos de avaliação que atendam à natureza das atividades, assegurados os princípios de transparência, periodicidade; participação do servidor; adequação aos conteúdos ocupacionais e às condições reais de trabalho, além do direito de recurso.
Em suma, se o panorama legal foi, ao início, omisso ou contraditório ao processo de desprecarização e qualificação de ACS e ACE, o mesmo, com o tempo, foi modificado e aperfeiçoado, de forma a facilitar a ação administrativa e a própria desprecarização de vínculos.
A complexidade do panorama jurídico acarretou iniciativas das equipes da SES-BA não só para entendê-lo e divulgá-lo, mas também para ampliá-lo, o que se deu, por exemplo, com o necessário apoio à formulação de leis municipais sobre o objeto em foco. Em um estado como a Bahia, com número de municípios superior a quatro centenas, grandes distâncias, dificuldades de acesso, diversidades culturais e econômicas marcantes, bem como forte influência de fatores político partidários, é fácil avaliar a densidade e a profundidade necessárias à abordagem técnica de tal função legiferante, que de toda forma se revelou bem sucedida, tendo o índice de adesão de municípios da ordem de 99%.
O processo de certificação representou outro desafio importante no cenário jurídico. Ele diz respeito aos processos seletivos pregressos para ACS, realizados com o apoio do Estado. Somente tornou-se possível o aproveitamento da quase totalidade dos ACS já atuantes nos municípios através de um processo de certificação tais seleções públicas, mediante a emissão de portarias assinadas pelo Secretário Estadual da Saúde, nos termos da Lei 11.350, evitando-se, assim, um novo processo de demissão e recontratação por seleção pública, o que demandaria tempo, dispêndio de recursos, além de desgaste político.
A obediência aos princípios legais e normativos estabelecidos é uma das marcas da iniciativa de desprecarização do trabalho na SESAB. Isso traz vantagens evidentes, do ponto de vista da sustentabilidade e da legitimidade dos processos, embora implique cuidados e desafios permanentes por parte dos agentes administrativos, dadas as mutações normativas freqüentes no panorama institucional da saúde no Brasil, com diferentes interpretações de conceitos. Tal é o caso, típico aliás, dos conceitos de “área” e “microárea”, que variam e divergem no cenário, tendo interpretação jurídica não necessariamente coincidente com a visão técnica da saúde.
Aponta-se também para a necessidade de correção de algumas falhas e distorções presentes nas leis, sendo citado explicitamente o caso da Lei 11.350, na qual a garantia de alguns direitos sociais não seria ampla o bastante, levando prejuízos aos trabalhadores.