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Iniciada em 1994, derivada do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), a Estratégia de Saúde da Família é entendida como essencial para a reorientação do modelo de atenção, além de constituir-se em porta de entrada do sistema de saúde. Entretanto, apesar da sua pertinência para a expansão da cobertura da atenção básica, constatada pelo grande número de Equipes de Saúde da Família implantadas em todo o país, cobrindo mais de 100 milhões de habitantes, ainda não se pode afirmar que as ações e serviços produzidos até o momento signifiquem de fato, uma mudança de conteúdo nas práticas e na forma de organização do processo de trabalho prevista nos documentos oficiais.
Tal situação pode estar vinculada ao fato de que, no SUS, uma parte substantiva da força de trabalho (que se calcula entre 30 a 50% dos empregados) não usufruam de direitos trabalhistas, caracterizando situação de emprego precário e o que é pior, mantido pela administração pública. Particularmente na Bahia, estudo preliminar sobre o mercado de trabalho na Estratégia de Saúde da Família realizado por consultores da Secretaria de Estado da Saúde (SES-BA) demonstrou que cerca de 70% das relações de trabalho na Estratégia de Saúde da Família são precárias. Observou-se ainda uma alta rotatividade de profissionais e instabilidade das equipes, fatos que comprometem a longitudinal idade do cuidado, o vínculo com a comunidade, o trabalho de equipe e o processo de educação permanente.
No caso particular dos Agentes Comunitários de Saúde (ACS), em 2007, apenas quinze de um total de quatrocentos e dezessete municípios, possuíam Lei Municipal criando cargos ou empregos públicos para ACS no âmbito das Secretarias Municipais de Saúde. A situação dos Agentes de Combate às Endemias (ACE) era ainda pior, visto que, sem um incentivo financeiro federal específico, a quase totalidade dos gestores municipais não admitiam a possibilidade de vinculação destes trabalhadores ao quadro permanente das Secretarias de Saúde.
Além de se constituir um grave problema social, gerador de alta rotatividade e insatisfação profissional, tal situação afeta diretamente a qualidade e continuidade dos serviços de saúde prestados à população, possibilitando a alguns gestores, dada a fragilidade do vínculo dos agentes, sua utilização em práticas clientelistas e eleitoreiras.
A aprovação no Congresso Nacional da Emenda Constitucional nº 51, de 14 de fevereiro de 2006 e da Lei Federal nº 11.350, de 05 de outubro de 2006, garantiu o respeito aos direitos trabalhistas e previdenciários dos ACS e ACE e a possibilidade da contratação direta pelos municípios através de seleções públicas. Com este cenário, a Secretaria Estadual de Saúde da Bahia encarou o desafio de formular uma política inédita, que estimulasse a regularização dos vínculos de trabalho tanto dos ACS quanto dos ACE, em respeito à legislação em vigor.
As diretrizes de tal política foram assim definidas no primeiro trimestre de 2007 e aprovadas pelo Conselho Estadual de Saúde em março do mesmo ano. Foi instituído um Grupo de Trabalho Interinstitucional para detalhamento de suas ações e acompanhamento da sua implementação, composto pelos seguintes atores sociais: Central Única dos Trabalhadores (CUT); Conselho Estadual de Secretarias Municipais de Saúde (COSEMS); Diretoria de Atenção Básica (DAB/SES-BA); Diretoria de Vigilância Epidemiológica (SES-BA); Escola de Formação Técnica em Saúde Prof. Jorge Novis (EFTS/SES-BA); Federação Baiana dos Agentes Comunitários de Saúde (FEBACS); Ministério Público Estadual (MPE); Ministério Público Federal do Trabalho (MPT); Sindicato dos Agentes Comunitários de Saúde e Contendores de Doenças Endêmicas e Epidemiológicas do Estado da Bahia (SINDACS); União dos Municípios da Bahia (UPB).
Este GT Insterinstitucional de forma consensual desenvolveu minutas de projeto de lei municipal criando cargos/empregos públicos de ACS e ACE, além de modelos de edital de seleção pública. De maio a agosto de 2007 foram distribuídas para todos os municípios da Bahia mais de 20 mil cartilhas contendo o detalhamento da Política, a íntegra da legislação federal em vigor, minutas de projeto de lei municipal para criação de cargos/empregos públicos de ACS e ACE, modelo de edital de seleção pública de ACS e ACE. Para os agentes foram confeccionadas e distribuídas mais de 30 mil cartilhas em versão de bolso contendo o resumo da política e da legislação federal pertinente.
Foram realizadas seis grandes audiências públicas com a participação do Ministério Público do Trabalho além de dezenas de oficinas regionais sobre a desprecarização dos vínculos de trabalho dos ACS e ACE. Também foi criado um sítio virtual (www.saude.ba.gov.br/dab/acs) com todas as informações da política e o conjunto dos trabalhadores da gestão estadual passaram a cotidianamente apoiar os municípios neste processo de desprecarização. A equipe da DAB/SES-BA elaborou Notas Técnicas e Manuais para orientar municípios quanto à gestão do trabalho dos ACS e operacionalização das seleções públicas.
De forma semelhante, a Diretoria de Vigilância Epidemiológica (DIVEP) publicou documentos que orientavam quanto à organização dos processos de trabalho dos ACE.
No âmbito nacional, o Ministério da Saúde – que há muitos anos instituíra um incentivo financeiro fundo a fundo de valor equivalente a um salário mínimo por ACS implantado no município, no ano de 2007 aumentou esse incentivo em 40%, adicional suficiente para o pagamento dos encargos trabalhistas e previdenciários de um trabalhador assalariado. Diante desse histórico estadual e federal, a Política de Desprecarização implementada pelo Estado da Bahia encontrou um campo mais fértil.