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Formação e educação permanente em saúde é tema de seminário internacional em Brasília

O Seminário Internacional Processo de Integração Educação e Trabalho e o Impacto no Cuidado: o papel da formação e da educação permanente nas Redes da Atenção ordenadas pela Atenção Básica reuniu, em Brasília, gestores das três instâncias do Sistema Único de Saúde (SUS), acadêmicos, pesquisadores e representantes de instituições de ensino em saúde para discutir a área de recursos humanos, observando experiências da Austrália, dos Estados Unidos, da Espanha dos 34 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O fortalecimento de políticas públicas voltadas para a formação e a educação permanente de profissionais de saúde, especialmente em países de sistemas universais, é um desafio em comum para a Europa e o Brasil.

“O governo federal teve coragem de trazer para si a responsabilidade de regulamentar a formação dos médicos. Cito, por exemplo, que pela primeira vez, a abertura de novos cursos de medicina não seguiu a norma de mercado nem da instituição de ensino. A premissa foi atender cidades com condições de integrar os estudantes de medicina nas Redes de Atenção à Saúde, utilizando unidades de saúde do SUS como local de qualificação do aprendizado”, ressaltou o ministro da Saúde, Arthur Chioro, atribuindo a atividade a outro eixo do Programa Mais Médicos desconhecido da mídia. O ministro informou que estão sendo feitos investimentos nas unidades básicas de saúde que serão unidades-escolas, mas que o sucesso da atividade decorrerá de um esforço coletivo entre governo federal, estadual e municipal.

O representante da Opas no Brasil, Joaquim Molina, reforçou a importância da cooperação técnica com o Brasil, especialmente, nos últimos dois anos. “A parceria entre Opas e Ministério da Saúde foi decisiva para viabilizar o planejamento, a elaboração e a implantação de políticas de gestão do trabalho e da educação em saúde”, destacou Molina. Ele também citou o trabalho da Rede de ObservaRH, que produz estudos e pesquisas sobre o setor. “A contribuição de iniciativas como os observatórios corrobora para o embasamento de políticas direcionadas à melhoria da distribuição e qualificação de profissionais de saúde, que resultou no Programa Mais Médicos para o Brasil”, concluiu Molina.  Também participaram da mesa de abertura representantes do Conass, Rita Cataneli, do Conasems, Luís Carlos Bolzan, e os secretários de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Heider Aurélio Pinto, e da Atenção à Saúde, Fausto Filho.

Troca de experiências

O sistema de saúde da Austrália, a formação médica e a fixação desses profissionais em áreas remotas e rurais foram apresentados pela Dra. Megan Cahill, CEO do Programa de Prática Geral e Treinamento do governo australiano. “Após a graduação, há um Treinamento Especializado, semelhante à Residência Médica, chamado Treinamento Pré-vocacional que se divide em módulos: Medicina Emergencial, Medicina Cirúrgica e Medicina Familiar, sendo este último, extremamente importante, pois permite ao médico um contato mais próximo com os pacientes. Há um esforço do governo australiano que este módulo seja obrigatório nos cursos de medicina para incentivar os futuros médicos a atuarem como médicos de família”, relatou Cahill.

O professor Naomar de Almeida Filho, reitor da Universidade do Sul da Bahia, destacou as semelhança e as diferenças dos sistemas de saúde australiano e do Brasil e as respectivas políticas de formação e distribuição dos médicos. “A Austrália tem uma experiência muito interessante no que se refere a fixação de médicos em áreas remotas e rurais. Há um esforço do governo, juntamente com entidades do setor, para criação de escolas de medicinas em áreas rurais, visando a captação de alunos da própria região”, destacou o debatedor. “Outra questão é que a Medicina de Família na Austrália é considerada uma especialização”, apontou o debatedor. “Também impressiona a determinação do governo australiano conceder a licença para médicos estrangeiros após passarem 10 anos em áreas rurais”, disse.

A experiência interprofissional entre médicos, assistentes de médicos e enfermeiros no sistema de saúde dos Estados Unidos foi destaque na apresentação do pesquisador Edward Salsberg, da Universidade de Washington. “O mercado já está investindo na Atenção Básica pois é menos oneroso gastar com clínicas do que com hospitais. Nós sabemos que os assistentes de médicos e os enfermeiros, cerca de 48%, atuam em programas de saúde na atenção básica. Deve-se levar em conta esses profissionais porque, na América, há uma escassez muito grande de médicos da família. Quando o médico se forma, cerca de 30 mil por ano, ele tem 150 áreas de especialização à disposição em 50 Estados do país”, relata Salsberg. “A produtividade de um time de profissionais, formado por médicos, assistente de médico e enfermeiros, beneficia o dobro de pacientes se comparado ao atendimento tradicional focado apenas no médico”, diz Salsberg.

Uma das estratégias do governo americano para melhorar o sistema de oferta do profissional médico na rede de atenção básica foi a ação do programa Expand Medical. “Consiste na expansão das escolas de medicina, por meio da criação de filiais de campus instalados a 50 milhas de distância da principal, beneficiando áreas mais remotas”, destacou o pesquisador. Outra medida é a adoção de tecnologias da informação em saúde, como o telessaúde, para apoiar os médicos generalistas.

O debatedor Félix Rígoli, coordenador da Unidade Técnica de Capacidades Humanas para a Saúde na Opas, defendeu que para atender as necessidades de saúde da população, como a questão das doenças crônicas, há necessidade de formar profissionais habilitados para trabalhar em equipe. “Dificilmente as doenças crônicas, como a diabetes, pode ser manejada adequadamente por apenas uma classe de profissional”, exemplifica Rígoli. “Também há a necessidade de se pensar no pacote de competências profissionais para atender uma determinada linha de cuidado”, sugeriu o debatedor. “O SUS é cheio de experiências inovadoras sobre formas de pagamento, contratação, que acabam se transformando em problemas jurídicos para o gestor. Porém a valorização dessas iniciativas como experimentos-pilotos são essenciais para o desenvolvimento do sistema de saúde. Os Estados Unidos tem muita experiência nessa área de pagamento de serviços”, destacou Rígoli.

O trabalho que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) faz sobre o setor saúde dos 34 países membros foi apresentado pelo economista Michael Schönstein. “As pesquisas desenvolvidas pela OCDE observam três desafios postos para o setor saúde dos países membros: o planejamento e o gerenciamento da força de trabalho, a distribuição dos profissionais internamente nos países e a qualidade da mão-de-obra ofertada”, disse Schonstein. Ele apresentou uma pesquisa que mostra a escassez de médicos generalistas em vários países e a distribuição desigual de médicos internamente. “Na França, por exemplo, há desertos médicos em bairros que ficam a menos de 5 quilômetros de Paris”, ressaltou. Porém, a pesquisa constata que há mais médicos hoje do que há 10 anos, um aumento de 2,85 médicos por mil habitantes em 2000, para 3,2 médicos por mil habitantes em 2011. “Mesmo com a crise financeira na Europa em 2008 os países aumentaram o número de médicos. Na França, houve um aumento de 10% no número de médicos, porém em decorrência da aposentadoria tardia, um item a ser considerado”, diz.

Para países com sistemas universais de saúde, Schönstein alerta para a necessidade do governo regular a formação dos profissionais médicos e a distribuição deles. “Na França, o Ministério da Saúde destina 50% das bolsas de residência para a Clínica Geral”, comentou. Ele citou o caso da Alemanha que tem a maior taxa de cirurgias no joelho, devido ao grande número de especialistas e por ser uma atividade altamente lucrativa para hospitais. “Porém esse serviço de saúde está longe das necessidades de saúde da população. As autoridades de saúde tem um papel muito importante para reverter esse cenário, manipulado pelo mercado, e induzir a formação de médicos generalistas”, defendeu.

Outra questão levantada pelo palestrante foi necessidade de discutir a realocação de tarefas dos profissionais de saúde. Ele citou que Japão, Dinamarca e Canadá tem mais de quatro enfermeiros por médicos, sendo que a média nos países da OCDE é de 2,6 enfermeiros por médicos. “Podemos verificar que os enfermeiros tem uma grande variedade de tarefas que devem ser melhores aproveitadas pelos sistemas de saúde”, afirma. O Brasil possui 0,8 enfermeiros por médicos e a Grécia, com o pior índice, de 0,5 enfermeiros por médico.

O seminário encerrou com atividades em grupos para discutir propostas para melhorar a política de formação e educação permanente no país.

Veja as apresentações:

– Dra. Megan Cahill, CEO do Programa de Prática Geral e Treinamento do governo australiano

–  Pesquisador Edward Salsberg, da Universidade de Washington.

Economista Michael Schönstein – OCDE

Veja as fotos do Seminário – https://www.flickr.com/photos/organize/?start_tab=new_set

 Por Vanessa Borges, para o Portal da Inovação em Saúde

 

 

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